São Paulo, quarta-feira, 7 de fevereiro de 1996
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Manaus, uma ficção

FERNANDO RODRIGUES

BRASÍLIA - Quem já observou com cuidado a caixa de um compact disc deve ter notado que, quase sempre, aparece a inscrição "produzido na Zona Franca de Manaus". É ficção pura.
Desde março de 93, os fabricantes de CDs são obrigados a executar em Manaus apenas três fases do processo produtivo de um CD: teste de áudio, injeção do estojo de plástico e colocação do disco e do material gráfico no estojo e embalagem final.
Por causa dessa regra maluca, cerca de 80% dos CDs produzidos no Brasil saem da prensa no eixo Rio-São Paulo, vão passear de avião até Manaus e voltam dentro do estojo de plástico.
A indústria brasileira faturou US$ 589,7 milhões com a venda de CDs no ano passado. Produziu 65 milhões de unidades. Desse total, apenas cerca de 20% pagaram imposto.
Quando o CD vai passear em Manaus, a empresa fica isenta de pagar os 15% de Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). Por incrível que pareça, os representantes da indústria não estão satisfeitos com essa situação.
Hoje à tarde, o presidente da Associação Brasileira de Produtores de Discos, Manuel Camero, será recebido pela ministra da Indústria, do Comércio e do Turismo, Dorothea Werneck.
"Vamos pedir para acabar com esse samba do crioulo doido. É inviável também para a indústria ficar enviando os discos para serem apenas embalados em Manaus", diz Camero.
Infelizmente, o problema não é de simples solução.
Obrigar a indústria a fabricar tudo em Manaus seria uma catástrofe. Não há infra-estrutura. Fazer a indústria pagar os 15% de IPI causaria um custo para o mais fraco da cadeia: o consumidor, que acabaria arcando com o aumento.
"Tudo bem que Manaus continue fabricando suas caixinhas de plástico. Poderíamos chegar a um consenso, com um IPI menor", sugere Camero.
O argumento dos fabricantes leva em conta só os seus interesses. Querem continuar a não pagar imposto -ou muito pouco- e deixarem de gastar com o avião que leva o CD para Manaus.
O governo tem um abacaxi nas mãos. Dezenas de outros produtos estão em situação similar. É o caso de tomar uma atitude drástica: dar fim no modelo atual de desenvolvimento da região amazônica. E já seria tarde.

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