São Paulo, quarta-feira, 7 de fevereiro de 1996
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Tudo tem um preço

CARLOS HEITOR CONY

RIO DE JANEIRO - Nunca entendi a importância dada à troca de ministros. Os especialistas garantem que o ministério, que há muito não é mais a espinha dorsal da administração (relegada a terceiros e quintos escalões), tornou-se o chassi da estrutura política, em torno dele se armam alianças e compromissos -e que tudo o mais vá para o inferno.
Mesmo não compreendendo essa importância, acredito que surgiu agora um bom pretexto para FHC mudar pelo menos um ministro, o do Trabalho. Não que o atual seja ruim, ou que pretenda um cargo vitalício no Judiciário trabalhista. Ocupar a pasta da Justiça, por exemplo, é vestibular obrigatório para o Supremo.
O problema é Vicentinho. Desde que Fernando Collor nomeou um sindicalista (Magri) para o ministério, ficou no ar a expectativa de alguma coisa dar certo. Deu errado, no caso de Magri, mas não custa tentar mais uma vez, sobretudo agora, depois de sua vitória na complicada arte de negociar com o governo.
De alguma forma, Vicentinho atendeu ao apelo que está em moda: tudo vai bem, o frango está barato, o Brasil merece entrar no Conselho de Segurança da ONU, dona Ruth está solidária com o Betinho, ficou mole governar o país, nem no tempo dos governos militares foi tão fácil, ninguém segura este país.
Vicentinho optou por colaborar, patrioticamente, sem segundas intenções, sem propósitos subalternos de carreira política ou empresarial. Mais puro do que ele só mesmo o Betinho, que vai ser destaque numa escola de samba aqui no Rio -e merece.
Com a adesão dos puros, os impuros que se danem ou, como queriam os militares, ame o Brasil ou deixe-o. Tudo parecia ir no melhor dos mundos de 1964 a 1985. Melhor prova: fomos tricampeões do mundo. Agora somos tetra, de hora em hora Deus sempre melhora.
O preço que pagamos pelo milagre foi alto, mas à custa desse preço surgiram lideranças como a do atual presidente da República. Que estava errado, afinal de contas, como errado estava o Vicentinho. Agora sim, estão certos. Ou acertados -o que não é a mesma coisa.

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