São Paulo, sábado, 10 de fevereiro de 1996
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Falta de opção

JOSÉ GOLDEMBERG

A rigor, numa economia de mercado como a que vivemos, o governo não deveria se envolver com as mensalidades escolares, como não se envolve no preço de outros serviços, como consultas médicas ou atendimento médico-hospitalar em geral.
A experiência das últimas décadas mostra bem o poder das forças de mercado em impedir a remarcação desenfreada de preços e a inflação; só para dar um exemplo, a abertura das importações estabeleceu um padrão de referência que força a baixa dos preços, como já se vê em inúmeros produtos consumidos no país.
Esse mecanismo não pode funcionar para mensalidades escolares porque não temos uma escola pública gratuita de boa qualidade e à qual tivessem acesso todos os que o desejassem. Se esse fosse o caso, só iriam para as escolas particulares aqueles que se dispusessem a cobrir os custos decorrentes, mesmo que fossem elevados. O mercado se encarregaria de fixar as mensalidades de acordo com o que fosse oferecido pelas escolas. É assim que o sistema funciona no resto do mundo e -para os ricos- é assim que funciona no Brasil.
Para as camadas mais pobres da população brasileira, contudo, a única opção é a escola pública gratuita, quer seja ela boa ou não; a regra é que ela não seja boa porque os professores são mal preparados e mal remunerados. Portanto, para essas camadas da população, a questão das mensalidades escolares é irrelevante.
Ela é, porém, relevante para boa parte da classe média, que vê na educação um mecanismo de ascensão social e procura as escolas particulares porque percebeu que a escola pública não resolve o problema dos seus filhos.
Essa é uma área onde a demanda é enorme e muitos proprietários de escolas particulares descobriram nela uma boa oportunidade de obter grandes lucros; é por isso que as mensalidades cresceram tanto no ano de 1995: cerca de 70%, muito mais que a inflação, inquietando as autoridades da área econômica do governo por pressionar os índices inflacionários e colocar em risco o próprio Plano Real.
Não há, portanto, outra alternativa a não ser tentar regular -aliás sem muito sucesso, como se tem visto- os ajustes das mensalidades escolares, o que contradiz a política geral do próprio governo de estimular o livre mercado.
Devido a essas contradições, o governo não deveria regular os ajustes das mensalidades escolares, mas não tem outra opção a não ser a de fazê-lo, no presente, até que a escola pública melhore, que é o problema fundamental e prioritário. Os outros são transitórios.

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