São Paulo, sábado, 10 de fevereiro de 1996
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Nossos migrantes

LUCIANO MENDES DE ALMEIDA

Acaba de se realizar, de 26 a 29 de janeiro, importante reunião de bispos católicos, em Dallas, nos Estados Unidos, sobre os imigrantes latino-americanos naquele país. Continua o fluxo de entradas e são numerosos os brasileiros, atraídos pela esperança e condições melhores de vida.
Não é fácil apresentar estatísticas oficiais porque cresce a presença de imigrantes irregulares que não conseguem a documentação requerida. Numa avaliação aproximativa, há cerca de um 1,2 milhão de brasileiros nos Estados Unidos, com notável densidade em Nova York e Boston.
Três aspectos suscitam reflexão:
1. Trata-se, geralmente, de imigrantes jovens que deixam o país, desiludidos pela falta de emprego. Entre eles não poucos são graduados, que deveriam exercer sua especialidade em bem de nosso povo.
Ao lado daqueles que conseguem vencer os obstáculos e se inserir na sociedade norte-americana há outros jovens -e são os casos mais frequentes- que ficam expostos a graves desafios e perigos, uma vez que perdem o amparo da família e devem se sujeitar, pelo menos no início, à solidão, às privações e ao aliciamento de ganho fácil.
Quem não conhece a história triste de rapazes e moças que, para se sustentar, envolveram-se no tráfico da droga, em casas de jogos, na prostituição e até em quadrilhas?
2. Surge, assim, a necessidade de oferecer aos imigrantes brasileiros, além dos serviços oficiais do Consulado, outras formas de atendimento, como associações, centros de pastoral e lugares de encontro.
Existem algumas iniciativas frutuosas, embora modestas, de atendimento religioso, apoio e proteção aos brasileiros. Mas há, ainda, muito por fazer e outros países já se organizaram melhor para acolher e auxiliar seus imigrantes.
3. A questão básica, no entanto, é a de perceber que, infelizmente, diminuem as oportunidades de emprego e bem-estar social em nosso país. Eis aí o problema que deve preocupar não só o governo, mas a inteira sociedade.
Com efeito, o fenômeno da imigração atinge milhares de famílias de lavradores que atravessam nossas fronteiras entrando na Bolívia e Paraguai e estende-se, agora, de modo surpreendente, aos descendentes de japoneses.
Nos últimos anos mais de 200 mil, quase todos jovens, deixaram o Brasil e conseguiram visto de entrada, esperando encontrar trabalho na terra de seus antepassados.
Para a consciência cristã, que deve se pautar pelos ensinamentos do Evangelho, é maior a responsabilidade de assumir a solidariedade fraterna e encontrar soluções viáveis.
Que fazer pelos desempregados e jovens que precisam ganhar a vida e formar um lar? Nas últimas semanas foram despedidos todos os operários de uma usina que encerrou sua produção, nos arredores de Ouro Branco, MG. Para onde irão?
Enquanto tarda uma decisão sobre a política agrária e agrícola mais abrangente, por que não lançar, sem demora, um "plano de emergência" para assentamento das famílias organizadas em acampamentos, com o devido apoio financeiro e assessoria técnica?
Não é razoável que continuem sem trabalho tantos brasileiros cada vez mais atraídos por outras nações, sem medir riscos e sacrifícios. Pelas riquezas naturais e competência profissional poderíamos não só atender a todo nosso povo, mas acolher fraternalmente e oferecer condições dignas de vida a imigrantes de países mais pobres.

D. Luciano Mendes de Almeida escreve aos sábados nesta coluna.

Texto Anterior: O senador do Brasil
Próximo Texto: Furos na reforma
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.