São Paulo, domingo, 11 de fevereiro de 1996
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Violência dos telejornais assusta mais

OTÁVIO DIAS
DE LONDRES

As crianças se assustam menos com programas de ficção -como filmes de terror ou de ação- do que com telejornais ou documentários.
As consequências que a exibição de cenas violentas na televisão podem ter no comportamento infantil foi tema de estudo do professor britânico David Buckingham, do Instituto de Educação da Universidade de Londres.
Os resultados acabam de ser publicados no livro "Imagens Emocionantes -Compreendendo as Reações Emocionais das Crianças à Televisão"(editora Universidade de Manchester, 1996).
"As crianças imitam o que vêem na televisão, assim como imitam os adultos e personagens de livros", afirmou Buckingham em entrevista à Folha.
"No entanto, o argumento de que isso as estimularia a ter comportamento mais anti-social ou 'violento' é, no mínimo, inadequado", disse.
O professor perguntou às crianças o que elas consideravam "perturbador" na TV, o que sentiam diante dessas cenas e como lidavam com essas emoções.
Entre os sentimentos mais comuns provocados por programas televisivos, as crianças citaram medo, tristeza, revolta, ódio e preocupação.
Elas desenvolvem mecanismos para se proteger de cenas "chocantes". Esses truques vão desde sair da sala e tapar olhos a prestar atenção em detalhes técnicos do programa, como, por exemplo, tentar desvendar os segredos por trás dos efeitos especiais.
O autor cita seu próprio filho, Nathan. Em um programa da série britânica "Casualty" (Acidente), que mostrava uma pessoa cheia de sangue, o garoto de 6 anos disse: "Não se preocupe. É tudo catchup".
"As crianças são usuários muito mais ativos e sofisticados da TV do se imagina", disse Buckingham.
"Suas respostas emocionais são inseparáveis do desenvolvimento do conhecimento da TV como um meio -seu entendimento de como e por quê um programa é feito, e das formas convencionais por intermédio das quais eles tendem a representar o mundo."
A pesquisa apurou ser mais difícil para o público infantil lidar com cenas de violência ou sofrimento em programas jornalísticos. Baseados em fatos reais, eles não permitem que a criança se afaste do que está vendo.
Segundo o professor, as crianças quase sempre reagem à exibição de tais cenas com uma pergunta: "Por que isso está acontecendo?". E nem sempre encontram uma resposta, seja no próprio programa ou com a ajuda dos pais.
Buckingham defende que os programas jornalísticos devem ser mais didáticos. "Muitos noticiários apresentam imagens descontextualizadas e não oferecem subsídios para que o público infantil e adulto compreenda e aprenda a lidar com acontecimentos", afirmou.
Segundo Buckingham, os pais, com frequência, dão respostas evasivas às perguntas das crianças. Isso acontece porque eles preferem evitar colocá-las em contato com a realidade ou porque não sabem responder.
No entanto, o professor é contra a censura dos programas jornalísticos. "É importante que as crianças tenham contato com o que está acontecendo no mundo. A melhor saída não é censura, mas uma explicação mais elaborada."

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