São Paulo, terça-feira, 13 de fevereiro de 1996
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Os juros estão em alta

CELSO PINTO

Os juros estão em queda, certo?
Errado. As taxas de juros nominais que o governo paga para colocar seus títulos no mercado têm caído consistentemente nos últimos meses.
A taxa efetiva era de 3,09% em outubro e ontem estava em 2,33%.
Isso não quer dizer, contudo, que as taxas de juros reais, isto é, descontada a inflação, estejam caindo na mesma proporção.
Ao contrário, qualquer que seja o indicador de inflação que se tome, os juros reais subiram em fevereiro. E são os juros reais os que, de fato, importam.
A Fipe (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas) anunciou ontem o resultado da inflação na primeira quadrissemana de fevereiro: 1,16%, comparado a 1,82% em janeiro.
A projeção para o mês de fevereiro caiu para apenas 0,5%.
Não é um caso isolado. Os dois outros principais indicadores de inflação, o IGP da Fundação Getúlio Vargas (1,9% em janeiro) e o INPC do IBGE (1,46% em janeiro), estão apontando para algo entre 0,7% e 0,8% este mês.
Ou seja, enquanto a taxa de inflação deverá cair pela metade de janeiro para fevereiro, a taxa nominal básica de juros baixou de 2,58% em janeiro para pouco mais de 2,3%.
Isso quer dizer que a taxa de juros real, descontada a inflação, poderá, em média, quase dobrar de janeiro para fevereiro, a menos que o Banco Central faça ela despencar nestes últimos dias úteis do mês.
Com isso, o juro real, anualizado, deverá saltar para a vizinhança dos 20% ao ano brutos, uns 3% ao ano acima do que se imaginava ser o alvo desejado pelo próprio BC.
É claro que o BC não tem compromisso de manter, mês a mês, o juro real dentro de seu alvo para todo o ano.
Pode-se muito bem argumentar que, se o juro real deverá subir muito em fevereiro, em função da queda da inflação, ele caiu provavelmente mais do que o desejado, em janeiro, pela razão oposta: a inflação acabou sendo maior do que se imaginava.
O problema é que erros de dosagem, para mais, nos juros custam muito caro.
Sobre uma dívida mobiliária que chegou, em dezembro, a R$ 108 bilhões (ou R$ 83 bilhões, se excluída a parcela do refinanciamento aos Estados), cada 0,5% de juros ao mês além do que o próprio BC, supostamente, consideraria razoável, custa mais R$ 400 milhões a R$ 500 milhões em juros.
Para se ter uma idéia, isto equivale, grosso modo, a quanto o Orçamento Geral da União prevê de desembolso mensal para despesas de outros custeios e capital, onde estão os investimentos em infra-estrutura e gastos com educação.
Seria um aumento intencional de juros reais? Pouco provável.
Embora o nível de atividades neste início de ano esteja algo acima do que o governo esperava, está muito longe de um "boom".
A suposta meta do BC para os juros reais básicos, algo em torno de 15% ao ano, líquidos, já é muito elevada.
Muitos economistas acham que, mesmo que cortasse os juros básicos, em termos reais, para algo como 12% líquidos, o BC continuaria praticando uma política austera e atraindo investidores.
Até porque, para o tomador final, as taxas continuam estratosféricas, por conta dos compulsórios, impostos e da generosa margem de lucro praticada pelos bancos.
Elevar ainda mais, desnecessariamente, os juros reais, é uma insensatez.
A banda cambial
Curiosa a reação do governo às declarações do diretor da Área Externa do BC, Gustavo Franco, a esta coluna, sobre o câmbio.
O ministro da Fazenda, Pedro Malan, mandou dizer que o sistema de banda cambial não muda e que a política cambial não é feita apenas pelo BC.
A coluna jamais disse o contrário.
O raciocínio de Franco é que, considerando a variação da inflação no Brasil e nos Estados Unidos e a diferença de produtividade entre as duas economias, ele não vê razão para que a cotação do real frente ao dólar mude ao longo do ano.
Isto não quer dizer que acabaria a banda, apenas que a cotação ficaria estacionada perto do piso.
A coluna lembrou que esta posição de Franco é polêmica e enfrenta a oposição interna no governo, tanto da Secretaria do Planejamento, quanto de economistas da Fazenda.
A discussão, contudo, existe e é relevante. A banda cambial, desde junho, tem funcionado numa só direção: a sistemática desvalorização do real, na contramão do mercado, inundado de dólares.
Na prática, o câmbio voltou a ficar indexado, desta vez ao IPA (Índice de Preços por Atacado), com todos os inconvenientes que isso traz -e trazia- antes do Plano Real.
Franco está sugerindo que esse tipo de política é desnecessário e que se o câmbio não mudasse, daqui para frente, os exportadores não sairiam perdendo.
A inflação, por sua vez, cairia ainda mais.
O argumento é polêmico, mas está posto. E vem de uma área crucial, embora não exclusiva, para a definição da política cambial.

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