São Paulo, domingo, 18 de fevereiro de 1996
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Carnaval é época de liberdade conjugal

PAULO SAMPAIO
DA REPORTAGEM LOCAL

O Carnaval abre um parêntese na rotina de muitas mulheres comprometidas. São quatro dias sagrados de folia liberada para elas. Se o companheiro habitual dessas mulheres não gosta de samba, elas costumam achar mais prudente ir sozinhas. Se ele gosta, propõem pular em "blocos" diferentes.
"Eu brinco no Pinel e ele no Internacionais", diz a empresária baiana Daniele Araújo, 30, referindo-se a dois trios elétricos que circulam por Salvador (BA). "Cada um vai atrás do seu", afirma.
O namoro dos dois dura menos de um ano, mas Daniele não abre mão da independência carnavalesca. "O povo mexe mesmo com a gente e eu não quero ninguém olhando feio para mim por causa disso", afirma.
Ela diz que todo mundo fica mais "solto" no Carnaval, mas não acredita em namoros duradouros que começaram nessa ocasião. "Todo mundo brinca, mas na quarta-feira está tudo acabado."
Mesmo assim, Daniele também não quer ter surpresas desagradáveis. "Fico mais tranquila sem ver a mulherada dando em cima do meu namorado", afirma.
A tranquilidade dela dura pelo menos dez horas, ou o tempo de uma volta completa do trio pela cidade. "A gente sai às duas da tarde e volta meia noite", diz. "Durante esse tempo, estamos completamente separados e protegidos pela multidão", afirma.
Proteger-se apenas pela multidão não é suficiente para a gerente de marketing paulista Patrícia Eckmann, 23, que vai para Salvador sem o namorado.
Os dois preferem passar o Carnaval longe um do outro. Eles namoram há dois anos e meio (ou três Carnavais), mas sempre "se separam" nessa época.
"Esse ano eu estou em Salvador, mas normalmente vou para o desfile na Marquês de Sapucaí (Rio) e ele para Ilhabela (SP)."
Patrícia diz que é impossível pular Carnaval a dois. "É uma época em que a gente tem que beber, se acabar. Não dá para ficar controlando alguém, nem ser controlada", diz (leia depoimento).
Homens controladores costumam fechar o tempo com a carioca Ana Beatriz Nascimento, 21, uma mulata de 1,73m, 54 kg, corpo escultural e que foi madrinha da bateria da Unidos de Vila Isabel, no Rio, por quatro anos.
Neste ano ela sai na Unidos da Tijuca com os seios de fora, e o namorado dela, um jogador de basquete que odeia Carnaval e está se concentrando com o time longe do Rio, já foi avisado.
"É a primeira coisa que eu aviso a quem quer alguma coisa comigo", diz a passista. "Eu não abro mão do carnaval na avenida de jeito nenhum."
Ana Beatriz está namorando há dez meses, mas diz que no Carnaval do ano passado eles já estavam flertando. "Ele nem reparou na minha fantasia", diz.
"Só foi perceber que era minúscula quando a Globo começou a exibir umas chamadas de Carnaval, nesse ano, com cenas de 95. Disse que toda vez que eu aparecia, ele morria de vergonha dos comentários dos amigos", conta.
Ana Beatriz diz que o assédio na avenida é grande, mas ela toma as suas precauções. "Só tiro o roupão e mostro o seio quando o carro está pronto para sair", afirma.
Ela conta que o desconforto é maior quando o namorado gosta de Carnaval. "Namorei um cara que era passista, quando eu era madrinha, e foi complicado. A sorte é que ele desapareceu depois do desfile e só voltou na quarta-feira de cinzas", diz.
Outra que desfila na avenida e quer paz no Carnaval é a professora paulista Rose Pricelli, 32. "Saio na Vai-Vai, em São Paulo, e na Beija Flor, no Rio. Desfilo há 18 anos e não abro mão disso."
Rose namora um médico que adora pescar e normalmente viaja no Carnaval. "Você já viu homem pescando sem mulher por perto?", argumenta Rose.

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