São Paulo, domingo, 18 de fevereiro de 1996
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A falência do governo

MARCOS CINTRA

O acordo entre sindicato de metalúrgicos e sindicatos ligados à Fiesp atesta, de forma irretorquível, que o país vem perdendo governabilidade.
Uma das qualidades exigidas em países em desenvolvimento é a capacidade de resolver problemas e ajustar as instituições públicas a constantes transformações. O Brasil encerra um ciclo de forte intervencionismo estatal. Agora, tenta passar para uma economia de mercado. Deixa décadas de inflação galopante. Assim, a sociedade exige mudanças profundas e, às vezes, imprevisíveis.
O governo precisa de agilidade para ajustar a economia e a administração pública. Foram com estas promessas e expectativas que as recentes administrações públicas tiveram início. Infelizmente, não se mostraram capazes de atender a essa necessidade social.
Quando isto ocorre, a sociedade pode reagir de pelo menos três maneiras: pacto contra o governo, guerra e acordo. Nos três casos, a sociedade toma a iniciativa de resolver o problema que enfrenta, colocando governo e instituições de lado. Tomar esta atitude implica correr riscos crescentes de profundo esgarçamento institucional.
O pacto contra o governo pode ser visto com clareza na questão da reforma tributária. Incapaz de suportar os ônus da estrutura tributária formal, a sociedade partiu, abertamente, para a sonegação, a evasão e a economia informal. A desintegração do sistema tributário brasileiro se aprofunda a cada momento em que o governo se mostra incapaz de liderar uma ampla reforma, explicitamente exigida pela sociedade, quando ela, por exemplo, se mostra favorável ao Imposto Único.
A reação conflituosa é ilustrada pelas invasões de terras. O problema se agrava com a passividade do governo, que aceita a violação do direito de propriedade e, assim, patrocina a escalada de violência.
A reação negociada pode ser vista no acordo desta semana. As partes concordaram em ignorar a lei, abrindo caminho para uma sociedade anômica.
Só um cego não consegue ver que, quando o povo toma iniciativas à revelia do governo, o país corre riscos de sério retrocesso institucional.

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