São Paulo, domingo, 18 de fevereiro de 1996
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Futebol europeu se 'fecha' para o Brasil

HUMBERTO SACCOMANDI
DA REPORTAGEM LOCAL

Uma decisão da Corte Européia de Justiça pode reduzir drasticamente o mercado para jogadores brasileiros na Europa e prejudicar os clubes do país.
A corte, órgão da União Européia (UE), proibiu no final de 1995 a cobrança de indenização no caso de transferência de jogadores sem contrato entre clubes de países da UE. Esses clubes também não podem mais limitar o número de jogadores comunitários (naturais de países da UE).
Essas medidas devem ser ratificadas amanhã, em reunião da cúpula da Uefa (a união européia de futebol), em Londres.
As proibições foram decididas no julgamento do chamado "caso Bosman". O jogador belga Jean-Marc Bosman entrou com uma ação na corte, que fica em Luxemburgo, contra as limitações impostas para sua contratação por um clube francês.
A corte considerou que as indenizações e a limitação de estrangeiros violavam os acordos de livre circulação de trabalhadores entre os países da UE.
Até agora, a Uefa aceitava o pagamento de indenização entre os clubes e permitia a escalação de até três estrangeiros por equipe.
Os jogadores comunitários, porém, não poderão mais ser incluídos nesse limite.
Assim, um clube alemão pode, por exemplo, contratar e escalar quantos jogadores franceses ou italianos quiser. E sem pagar nada aos clubes de origem dos atletas.
Essas normas valem, por enquanto, para os 15 países da UE. Mas podem se estender em breve para toda a Europa.
"Sem dúvida os clubes vão privilegiar os jogadores europeus, que não custam nada e podem ser escalados livremente", disse à Folha Sandro Sabatini, porta-voz da Inter de Milão, clube dos brasileiros Roberto Carlos e Caio.
Segundo ele, haverá sempre mercado para os craques brasileiros, mas cada vez menos espaço para jogadores medianos.
Os clubes continuarão podendo cobrar indenizações por transferência de jogadores não-comunitários, como os sul-americanos.
O empresário André Figger, que intermedeia jogadores brasileiros para o exterior, espera uma redução nas transferências.
"Ainda não sentimos o impacto dessas medidas, mas prevemos que elas terão uma repercussão forte, reduzindo a quantidade de jogadores brasileiros que irão para clubes europeus", disse Figger.
Além do efeito na quantidade de transferências, o caso Bosman deve afetar ainda as finanças dos clubes brasileiros.
"Dificilmente as equipes européias estarão dispostas a continuar pagando altas somas por jogadores brasileiros. Podemos contratar bons jogadores na Europa sem pagar nada", disse Sabatini.
Segundo ele, os craques ainda serão disputados a peso de ouro pelos clubes europeus, mas jogadores comuns, não mais.
O meia Raí, ex-jogador do São Paulo e da seleção brasileira, atualmente no clube francês Paris Saint-German, concorda com isso.
"Sempre haverá mercado para os bons jogadores brasileiros, pois eles são muito disputados na Europa, mas as novas normas favorecem a contratação de europeus", disse o jogador.
As novas normas provocaram reações diferentes na Europa, que variam de país para país.
Os jogadores, em geral, são a favor. A Uefa é contra. Acredita que as medidas vão favorecer os clubes grandes e ricos.
"Os campeonatos nacionais vão desaparecer em favor de torneios supranacionais", disse o secretário-geral da Uefa, Gerhard Aigner.
Os clubes temem algumas consequências das medidas. Os mais ricos, porém, são a favor.
"Sou favorável à liberalização total. Se temos 50% de carros importados na Itália, porque não posso ter 50% de estrangeiros no meu time", disse o italiano Giovanni Agnelli, patrono da Juventus e chefão da Fiat.

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