São Paulo, segunda-feira, 19 de fevereiro de 1996
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Como criar empregos

ANDRÉ FRANCO MONTORO

É importante que a resolução do governo federal, na reunião de 15 de novembro último, "de eleger o combate ao desemprego como prioridade número um para 1996", não fique no plano dos bons propósitos. Nem se limite a grandes projetos governamentais centralizados e burocráticos.
O combate ao desemprego é tarefa de toda a sociedade. Cabe aos governos federal, estaduais e municipais, dentro de suas atribuições, apoiar as atividades geradoras de emprego, desenvolvidas pelos amplos setores da vida nacional.
Facilidades de financiamentos, isenções tributárias, assistência técnica e outras modalidades de apoio e estímulo representam a contribuição indispensável dos órgãos governamentais. Mas as ações concretas de geração de emprego e oportunidades de trabalho são necessariamente locais, descentralizadas e com a participação ativa dos interessados e das respectivas comunidades.
Esses caminhos, amplamente debatidos no recente Seminário Latino-Americano sobre Criação de Emprego -realizado em continuidade da Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Social-, são fundamentalmente os seguintes: 1) pequena empresa; 2) agricultura familiar; 3) cooperativas e outras modalidades associativas; 4) construção de habitações e obras públicas; 5) turismo; e 6) a educação para o trabalho.
As pequenas empresas, incluindo as micro, pequenas e médias, atuam nas múltiplas atividades de fabricação, comércio, serviços, artesanato e outros. São as grandes geradoras de trabalho e renda para milhões de brasileiros.
Desde as empresas de fundo de quintal, ao lado de milhões de experiências municipais e locais de microempresas, apoiadas por organizações como a FAO, Sebrae, Senai, Senac e entidades sociais, até o sucesso crescente das modalidades de franquia e terceirização, o mundo das pequenas empresas é hoje uma das bases de nossa economia real.
Cabe ao poder público apoiá-las de forma adequada. A própria Constituição determina que "a União, os Estados e municípios dispensarão às empresas de pequeno porte tratamento jurídico diferenciado, visando a incentivá-las pela simplificação de suas obrigações administrativas, tributárias, previdenciárias e creditícias".
A agricultura familiar é a grande fonte de subsistência, produção e oportunidade de trabalho no meio rural. Sua importância pode ser avaliada pelos seguintes dados oficiais:
1) Ela representa mais de 6 milhões de estabelecimentos ou unidades rurais; 2) É responsável por elevada parcela de nossa produção agropecuária, chegando a superar a grande agricultura patronal na produção de leite, ovos, batata, trigo, cacau, banana, café, milho, feijão, tomate, mandioca, laranja, carne suína e de aves;
3) a grande capacidade da agricultura familiar para absorver mão-de-obra evidencia-se no fato de que ela mantém sete vezes mais postos de trabalho por unidade de área do que a grande agricultura patronal (fonte: FAO-Incra, 1995).
Esses fatos levaram o governo federal a elaborar o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf). É importante que esse programa não fique nos gabinetes de Brasília e cumpra seu princípio orientador: "As ações a serem executadas devem ocorrer a nível municipal, fortalecendo-se as organizações comunitárias e estabelecendo ações conjuntas do poder público federal, estadual e municipal".
As cooperativas e outras formas de associativismo constituem poderoso instrumento de geração de emprego e transformação social. Cooperativas de trabalho, produção, consumo, crédito e serviços de múltiplas espécies representam um mundo de realidades e oportunidades que deve ser apoiado.
No seminário foram apresentados exemplos concretos de cooperativas de empregados que assumiram a direção de fábricas e empresas em situação de falência, assegurando o emprego de milhares de trabalhadores. É preciso tornar realidade o imperativo do artigo 174, parágrafo 2º da Constituição: "A lei apoiará e estimulará o cooperativismo e outras formas de associativismo".
A construção civil, especialmente de casas populares, além de sua importância social, é outra fonte multiplicadora de empregos. A mesma importância aplicada na construção de casas gera 20 vezes mais empregos do que a aplicada em setores industriais.
O turismo é hoje, e será cada vez mais, um dos maiores instrumentos criadores de trabalho e renda em todas as regiões do país. No seminário latino-americano, o presidente da Embratur apontou um exemplo eloquente. A projetada unidade da Petrobrás no Nordeste deve gerar aproximadamente 300 empregos. Com igual investimento, o plano de desenvolvimento do turismo no Nordeste deve gerar 22 mil empregos.
Finalmente, as experiências de educação para o trabalho e os cursos profissionalizantes que se multiplicam em todo o Brasil representam a abertura de oportunidades e novas perspectivas de trabalho e desenvolvimento para múltiplos setores de nossa população.
Foi com base nas pequenas e médias empresas que a Itália, a Alemanha e outros países formaram sua classe média e superaram suas crises. Ao lado das preocupações com a macroeconomia, o governo não pode esquecer que as pequenas empresas constituem a base e a sustentação da economia real do país.

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