São Paulo, quinta-feira, 22 de fevereiro de 1996
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Da utilidade dos sociólogos

CLÓVIS ROSSI

SÃO PAULO - Se eu já tivesse atingido o grau de megalomania de alguns colunistas brasileiros, acharia que o sociólogo francês Alain Touraine copiou idéias minhas para o seu texto de domingo no Mais!.
Afinal, partimos ambos do mesmo evento (o Fórum Econômico Mundial, de Davos, na Suíça) e chegamos
à mesma conclusão, a de que há uma assustadora uniformidade de idéias no mundo contemporâneo. Ou o que Touraine chamou de "pensamento único".
Como meu texto saiu 15 dias antes do dele, poderia acusá-lo de plágio, não fora o fato de que falta esclarecer umas 512.342 dúvidas antes de poder atingir o estágio de megalomaníaco.
E, do jeito que vão as coisas, não terei tempo de vida para esclarecê-las todas. Touraine poderia ter colaborado. Sociólogos, antigamente, serviam justamente para isso. Ou seja, para iluminar caminhos, explicar fenômenos etc.
No artigo de domingo, Touraine faz o que até eu consigo fazer: constatar um fenômeno. Não dá pistas de como sair dele, limitando-se a dizer que "o importante, nos dias de hoje, é sair dessa transição liberal, e não ingressar nela".
Por "transição liberal" entenda-se o predomínio absoluto do tal "pensamento comum" a que o mestre francês se refere.
O problema é como sair dessa transição, quando qualquer pensamento que choque com o "único" é descartado, ridicularizado, humilhado.
De qualquer forma, é positivo que um sociólogo de renome internacional -ainda mais no caso de Touraine, que tem acesso aos ouvidos do presidente Fernando Henrique Cardoso- faça tal constatação.
Seria muito pior o silêncio dos cordeiros, a covardia do amém-sim-senhor, a rendição a postulados que, por mais corretos que muitos sejam, não podem ser erigidos como a verdade absoluta e incontrastável.
Só falta agora que outros cientistas do peso dele se aventurem pela mesma senda e, mais do que isso, joguem também luzes sobre como sair da "transição liberal". É o papel dos cientistas sociais, não é?

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