São Paulo, domingo, 25 de fevereiro de 1996
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Encargos, alhos e bugalhos

ANTONIO KANDIR

Dar nome igual a coisas diferentes é um deslize verbal que a lógica condena. Quando as coisas em questão são fatos sociais de grande importância, o erro lógico pode ter consequências graves. Esse é o risco do debate cada vez mais aceso sobre encargos trabalhistas.
Está na hora, portanto, de separar o joio do trigo e estabelecer uma diretriz geral clara a respeito do problema, sob pena de que, em vez das mudanças necessárias ao incremento da competitividade e ao estímulo do emprego formal, tenhamos um estado de anomia e insegurança que resulte no exato oposto dos objetivos pretendidos.
Há encargos e encargos e não é o caso de dizer-se que são todos, indistintamente, fardos inúteis que pesam sobre os ombros das empresas sem produzir benefício algum aos trabalhadores.
Há encargos como o 13º salário e o descanso semanal remunerado. Trata-se de encargos que compõem de modo permanente o fluxo de rendimentos do trabalhador. São direitos sociais e fazem parte do salário real do trabalhador.
Há também encargos, como a contribuição previdenciária e o FGTS, que, em algum momento, são convertidos em rendimentos para o trabalhador. São encargos que correspondem à renda futura do trabalhador e, assim, integram igualmente sua remuneração.
Há ainda encargos, como a Cofins e o PIS-Pasep, que são responsáveis pelo financiamento de políticas e gastos públicos indispensáveis. A Saúde pública depende da Cofins, o seguro-desemprego do PIS-Pasep e os trabalhadores de menor renda, de ambos.
O mal dessas contribuições sociais não é que sejam cobradas, mas sim que o sejam sobre a folha de pagamentos e em cascata. São necessárias, mas fora do lugar. Trata-se, portanto, de mudar-lhes a base de incidência e eliminar-lhes a cumulatividade, objetivos de projeto que pretendo apresentar na Câmara dos Deputados.
Há, por fim, uma quantidade numerosa de contribuições que, sendo individualmente pouco expressivas, pesam em seu conjunto sobre a folha de pagamentos. São contribuições cuja eliminação deve ser seriamente cogitada. Mas também aí é preciso fazer distinções.
Como o Brasil precisa ter políticas e instrumentos eficazes de qualificação da mão-de-obra, as contribuições que financiam atividades de treinamento e retreinamento de mão-de-obra devem ser eliminadas sem que as atividades financiadas sofram solução de continuidade.
Para tanto, a eliminação dessas contribuições deve ser acompanhada do firme compromisso de passar a financiar essas atividades com recursos do FAT. Quanto às contribuições associadas a atividades de outra natureza, deve-se caminhar no sentido de substituí-las por formas voluntárias de financiamento.

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