São Paulo, domingo, 25 de fevereiro de 1996
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Um "Oscar" para o governo FHC

ALOYSIO BIONDI

Além do "Quatrilho", o Brasil tem outro candidato ao "Oscar": o governo FHC, digno de prêmios pela capacidade excepcional de criar explicações otimistas, auto-elogiativas, para os piores problemas que ele mesmo cria.
Colocando os Spielbergs no bolso, a equipe FHC esbanja competência na categoria de "efeitos especiais", apresentando à opinião pública o avesso da realidade. Seu brilho ficou patente, mais uma vez, no pronunciamento que os escribas de Brasília redigiram para o presidente FHC fazer, pelo rádio, sobre preços dos alimentos e colheitas de 96.
O que diz a equipe FHC? Primeiro: que a renda dos agricultores vai crescer 20% este ano, e isso é uma excelente conquista. Segundo: que a conquista é um mérito do governo, que (literalmente) "semeou" para colher, isto é, tomou providências para garantir as colheitas. Terceiro: graças a ele, o povo brasileiro vai continuar a alimentar-se em 1996. A realidade:
Renda agrícola - É a soma dos valores que os agricultores recebem, em determinado ano, pela venda de suas colheitas. Ela vai crescer realmente (não 20%, mas 8%) em 1996. Por que a produção cresceu graças "às providências do governo"? Não. A produção caiu. Assim, os preços subiram. A renda vai crescer porque preços do milho, soja, arroz e trigo "dispararam" na comparação com 1995. Há altas de 50% a 80%, em um ano.
Apoio - Com a equipe FHC, a agricultura brasileira sofreu um dos piores massacres de todos os tempos. Teve imensos prejuízos, com preços baixíssimos, na colheita do ano passado. Por que? Porque o governo não comprou a produção. Não houve crédito. E, como se isso não bastasse, a equipe FHC tomou a decisão bárbara de forçar a redução do plantio para a safra deste ano.
Como? Por incrível que pareça, decidiu cortar os preços mínimos das principais culturas de alimentos: uma decisão anunciada em agosto do ano passado, época da semeadura no Centro-Sul. Por que? Visão caolha da equipe FHC: quis reduzir as colheitas para que o governo não precisasse comprar estoques, este ano. Alega que emitir dinheiro para isso "provoca inflação".
Consumidor - É óbvio que, se a renda agrícola vai subir porque os preços estão subindo, e é o consumidor que os paga, não vai poder "alimentar-se melhor".
As técnicas de "efeitos especiais" têm ajudado a manter a imagem favorável do governo. Mas elas trazem um perigo: que o próprio presidente passe a acreditar nas fantasias. E aí, deixe de tentar resolver problemas. Um dia, as crises explodem.
Ficha técnica
A equipe FHC liberou as importações, provocou déficits monstruosos, "torrando" dólares. Elevou os juros, para atrair dólares (especulativos, não reservas mesmo). Emitiu reais e depois títulos para comprar dólares, e fez a dívida interna explodir. Juros e dívidas provocam "rombos" no Tesouro. Mas o Real vai bem. "Oscar" merecido.
Pirotecnia
Já se fala que o "rombo" do Nacional pode aproximar-se dos R$ 10 bilhões. Nova explicação: o "buraco" aumentou porque o banco pagou R$ 3,5 bi à CEF e ao Banco do Brasil. Avesso da verdade. A CEF e o BB passaram a socorrer o Nacional, com os R$ 3,5 bi, depois que ele já estava quebrado, por ordens "superiores". Esses R$ 3,5 bi, portanto, já fazem parte da última operação-socorro.
Perguntinha
Para criar criar o Proer, programa de socorro aos bancos, o governo alegou que eles estavam enfrentando problemas com a queda da inflação. Agora, os balanços do setor mostram lucros fantásticos, de 20% a 40% ou 50% sobre o patrimônio (principalmente, se descontadas provisões "inchadas"). As "quebras" tiveram outros motivos. O Congresso vai aprovar o Proer?
Sinais amarelos
Neste mês de março, vencem R$ 35 bilhões em títulos da dívida do governo federal.
O Banco Central vai ter de vender títulos em igual valor, para "rolar" os débitos. O ingresso de dólares nas duas últimas semanas caiu verticalmente -e não foi por causa das "barreiras" criadas pelo governo.

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