São Paulo, domingo, 3 de março de 1996
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Gordura que não engorda exigiu anos de pesquisa

JOSÉ REIS
ESPECIAL PARA A FOLHA

Por que tanto bulício em torno da aprovação da comercialização de olestra, produto dietético desenvolvido pela Procter and Gamble? A decisão final, após várias provas e discussões que duraram quase duas décadas, só dependem do diretor do FDA, o departamento americano que analisa e licencia medicamentos e alimentos que afinal a concedeu.
A resposta se encontra na natureza mesma do produto, uma "gordura sem gordura", que passa pelo tubo digestivo sem ser digerida ou absorvida, saindo por uma ponta como entrou pela outra. Assim os gulosos podem ingerir olestra à vontade, como se fossem gorduras comuns sem os riscos a elas associados, como obesidade, hipertensão, acidentes vasculares, diabetes, excesso de colesterol, câncer etc.
A história de olestra começa há muitos anos, quando os pesquisadores da empresa começaram a estudar gorduras de mais fácil digestão pelos bebês.
Para isso, trataram de investigar como o organismo digere as gorduras naturais (triglicérides). As gorduras pertencem a uma classe de produtos chamados éteres e constituídos pela ligação de moléculas de ácidos e álcoois.
Os cientistas quiseram saber o número de ácidos que se podem ligar aos álcoois. Em laboratório descobriram que uma molécula de ácido ligada a uma de álcool funciona bem, porém misturas de mais de três elementos de cada apresentava difícil digestão.
Chegaram os cientistas a um produto chamado sacarose-poliéster, constituído por oito ácidos graxos aglomerados em torno de grupos alcoólicos que, por sua vez, estão pendurados num anel de moléculas de sacarose.
Era violento contraste em relação às gorduras naturais, que possuem apenas três ácidos graxos. O modo de ação das novas gorduras é fácil de entender.
Tudo depende da ação de uma enzima, a lipase, que decompõe o triglicéride em pedaços que penetram no sangue e alimentam o corpo. Mas as moléculas de olestra são muito maiores e compactas, não permitindo a passagem entre elas dos fragmentos provenientes da ação da lipase. Assim, a olestra ingerida acaba passando o tubo digestivo sem ser absorvida pelo sangue.
As provas com olestra mostraram que ela não é tóxica, mas alguns especialistas dizem que ela pode causar flatulência, cólica e, em algumas pessoas, um corrimento anal que suja a roupa de baixo, ou a chamada crise fecal, que é o desejo súbito e incontrolável de "ir lá dentro".
Além desses alegados inconvenientes, olestra retira dos alimentos, por absorção, vitaminas A, D, E e K, além de todo o importante grupo dos carotenóides presentes nos legumes, no melão, na cenoura, no espinafre etc. A seu favor se contariam a falta de calorias, a falta de gorduras, a ausência de colesterol.

Texto Anterior: Dieta era mais saudável
Próximo Texto: ECOLOGIA; A PALAVRA; CORAIS; GENÉTICA; COMPORTAMENTO; PRESERVATIVO; MEDICINA; AFRODISÍACO
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.