São Paulo, domingo, 3 de março de 1996
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O MENOS PIOR

O presidente Fernando Henrique Cardoso afirma não ter dito, no jantar de quarta-feira com um grupo de parlamentares, que seria fácil fechar o Congresso Nacional, até porque não haveria oposição popular.
Mas o fato, profundamente lamentável, é que a popularidade do Legislativo é muito baixa. E não se trata de uma verdade restrita ao Brasil. Espalha-se por boa parte do mundo, especialmente o subdesenvolvido.
Prova-o o fato de que, no Peru, Alberto Fujimori fechou o Congresso e, não obstante, sua popularidade aumentou em vez de cair.
Grande parte da culpa é dos próprios congressistas. O mundo mudou com uma alucinante velocidade, tornou-se infinitamente mais complexo e diversificado. E o Congresso, para dizer o menos, parece parado no tempo, amarrado à política com "pê" minúsculo, dos interesses paroquiais, quando não pessoais.
Em parte por isso, cresceu o desprezo à política em geral. É assim até nos EUA, a ponto de recente pesquisa ter apurado que a metade dos norte-americanos nem sequer sabe o nome do vice-presidente do país (Al Gore).
Essa reação popular equivale à atitude do avestruz, que, ao menor sinal de perigo, enfia a cabeça na terra. Não evita o perigo; apenas não o vê aproximar-se. Da mesma forma, ignorar ou desprezar a política não impede o fato, de resto inexorável, de que a política é determinante.
Crises econômicas, absurdos sociais, carências educacionais ou de saúde -nada disso nasce por geração espontânea. É fruto, em última análise, de decisões políticas.
Parece óbvio que tais decisões tendem a ser tanto mais corretas quanto maior for o número de cidadãos envolvidos na discussão da agenda nacional a cada momento. A solução, portanto, não é fechar o Congresso, por exemplo, o que equivaleria a menos política. Ao contrário do que diz a crença popular, o caminho é mais política, no seu sentido mais nobre, o de envolvimento de crescente número de cidadãos no debate público, via partidos, sindicatos, organizações não-governamentais, entidades comunitárias ou até via Internet.
Até porque as mudanças no mundo ainda não ultrapassaram a constatação de Winston Churchill segundo a qual a democracia é o pior dos regimes, exceto todos os outros.

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