São Paulo, quarta-feira, 6 de março de 1996
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Confissão oficial

JANIO DE FREITAS

Uma só questão bastou para que Gustavo Loyola entregasse o ouro dos, e não aos, bandidos. Eis o diálogo, ocorrido logo depois que o presidente do Banco Central acabou a enrolação expositiva para ganhar tempo:
Pergunta: Na sua exposição, o senhor disse que o Proer (o programa supostamente de reestruturação de bancos) já aplicou 5 bilhões e 890 milhões de reais. Para quantos bancos?
Loyola: Um único.
Pergunta: Qual?
Loyola: Nacional.
Era a indagação que, feita ontem pelo deputado Benito Gama, no domingo se apontava aqui como suficiente para levar à comprovação, perante o Congresso, de que o Proer foi criado por Fernando Henrique Cardoso, na tal medida provisória elaborada noite a dentro de um sábado, para dar aos donos do Nacional os bilhões que os salvariam do estouro.
Em quatro meses de vigência, a medida provisória criada para apoiar, segundo o governo e o presidente, os bancos com problemas decorrentes do fim da inflação, serviu só ao que tem a nora de Fernando Henrique como sócia e diretora.
Loyola soltou um dado complementar de sua confirmação involuntária. Disse ele que teve conhecimento, com o Banco Central, da situação financeira e das fraudes no Nacional em 4 de outubro, narradas por Marcos Magalhães Pinto, presidente do banco.
A medida provisória que deu ao governo meios de passar R$ 5,9 bilhões ao Nacional foi concluída no fim de semana de 4 novembro e publicada em 6 de novembro. Um mês depois da narrativa citada por Loyola. Logo, a MP foi preparada e os bilhões entregues ao Nacional quando o Banco Central e Fernando Henrique (este, segundo informação dada antes pelo mesmo Loyola) já tinham pleno conhecimento do rombo criminoso no Nacional.
Se, àquela altura do depoimento, alguém passasse algemas no depoente e fosse, com ele posto no camburão, recolher os outros autores da promiscuidade de dinheiro público, Banco Central e proteção a fraudadores, seria possível dizer que alguém, nesta história de indignidades e imoralidades, teve um gesto direito.
Tudo foi armado, porém, para o resultado à brasileira, do qual Fernando Henrique passa a ser também um dos expoentes. O príncipe. A confissão de Loyola em nada resultará, porque é (ainda) inabalável o domínio do príncipe sobre o Congresso, os meios de comunicação e seus jornalistas, a Procuradoria Geral da República, as instâncias mais altas do Judiciário.
Isso não diminui a generosidade de Loyola para com o país, dando caráter oficial a algumas verdades que tentam furar o cerco. E mais gratidão merece Loyola por ter, com suas gafes confessoras, invalidado o adestramento a que parlamentares governistas e outros governistas o submeteram até tarde da noite de anteontem, para que nada dissesse de comprometedor.
Um dos adestradores era, atestando o grau de degeneração a que chega o Congresso, o próprio condutor da sessão de depoimento, senador Ney Suassuna. Foi o que acabou recebendo de Antônio Carlos Magalhães um tabefe no rosto. E não há dúvida de que bem aplicado (não interprete mal, refiro-me à pontaria).

Texto Anterior: Tribunal pede intervenção em Alagoas
Próximo Texto: CUT rompe com governo e deixa acordo da reforma
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.