São Paulo, quinta-feira, 7 de março de 1996
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

O prejuízo do BB

CELSO PINTO

Até o final do mês, o Banco do Brasil deverá divulgar que fechou o ano passado com um prejuízo estimado em R$ 4 bilhões, sem precedentes em sua história.
Será uma boa forma de lembrar que a crise não se limitou aos bancos privados, embora pouco se discuta sobre a situação dos bancos oficiais.
Como o BB é gigantesco, o tamanho do baque provocado pelo Plano Real também foi gigantesco.
Seu ganho com a alta inflação, que chegou a R$ 3,2 bilhões no primeiro semestre de 1994, caiu para R$ 180 milhões no primeiro semestre do ano passado.
Enquanto isso, as provisões para devedores duvidosos, que em 94 equivaliam a cerca de 4% dos empréstimos, subiram para 11% no ano passado. O diretor financeiro do BB, Carlos Gilberto Caetano, diz que foram gastos R$ 2,5 bilhões, só para reforçar as provisões.
O BB foi, ainda, vítima da valorização do real frente ao dólar nos primeiros seis meses do plano.
Como o BB tem U$ 5,5 bilhões em títulos da dívida externa brasileira em sua carteira, o dólar mais fraco gerou um prejuízo contábil (que só seria realizado se o BB vendesse os papéis, recebendo menos reais por eles).
O governo deu uma colher de chá para o BB e permitiu que, em vez de absorver integralmente o prejuízo no balanço do segundo semestre de 94, ele diferisse a perda em cinco semestres. No ano passado, só esta perda cambial representou cerca de R$ 1,5 bilhão, segundo Caetano.
O impacto sobre o patrimônio líquido do BB foi desastroso. Em novembro, ele estava em R$ 3,4 bilhões e deve ter fechado dezembro próximo a este valor. O ativo total representava 20 vezes o valor do patrimônio.
Os US$ 5,5 bilhões em títulos da dívida brasileira que o BB possui, valem, no mercado, apenas cerca de 75% de seu valor de face.
O Banco do Brasil os contabiliza pelo valor integral apoiado nas regras e porque, como diz Caetano, não pretende se desfazer deles até o vencimento. Supõe, portanto, que receberá o valor integral.
Alguns banqueiros privados acham que uma avaliação mais rigorosa do desempenho do BB deveria levar em conta o valor de mercado dos títulos da dívida. Se isso fosse feito, o patrimônio líquido se reduziria a cerca de R$ 2 bilhões.
Tal como no caso dos bancos Econômico e Nacional, os problemas do BB não nasceram com o Plano Real nem se explicam apenas por ele. Uma diferença importante é que o BB, pela primeira vez em muito tempo, fez um esforço efetivo, no ano passado, para tentar corrigi-los.
Enquanto o Nacional, por exemplo, inchava resultados repactuando empréstimos impagáveis (ou, em muitos casos, fictícios), o BB fez algo raro em sua história: começou a cobrar os devedores. Acabou aumentando a inadimplência, mas há uma saudável dose de realismo neste salto.
Ao mesmo tempo, ficou mais exigente na concessão de novos créditos. Caetano diz que o BB classifica a qualidade dos tomadores de "A" a "E". Passou a aprovar novos créditos apenas para tomadores nível "A".
Nem tudo foram más notícias. O BB acabou sendo um dos grandes beneficiários da crise dos bancos privados. O medo de quebras levou os investidores a buscar os bancos maiores.
Com isso, o BB elevou sua participação na captação de poupança de 14% para 21% do total e a de depósitos a prazo, de 13% para 17%.
Lucrou ainda, confirma Caetano, colocando dinheiro nos bancos Econômico e Nacional, por meio do interbancário.
Como eram bancos em dificuldades, pagavam bem mais do que os outros. No final, o BB recebeu todo o dinheiro de volta e embolsou o lucro extra.
O final da história, contudo, ainda não é feliz.
Neste ano, o BB terá que absorver cerca de R$ 900 milhões do prejuízo cambial de 94, que só será reduzido se o real for desvalorizado com mais vigor. O que faz, ironicamente, com que o BB seja um torcedor involuntário por uma máxi.
A inadimplência não acabou, embora deva crescer menos. E a reestruturação necessária em termos de custos está muito longe do necessário.
A radiografia do BB serve, de todo modo, como um alerta. Nenhum banco privado, provavelmente, sobreviveria intacto a um prejuízo de R$ 4 bilhões -ainda por cima, recebendo depósitos adicionais de investidores preocupados com os outros bancos.
Se não houver rigor no ajuste exigido dos bancos oficiais, portanto, eles acabarão sendo, injustamente, os beneficiários da concentração no sistema.

Texto Anterior: Dow Jones põe BC em 6º
Próximo Texto: FHC afirma que CPI é "inconveniente"
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.