São Paulo, sexta-feira, 8 de março de 1996
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'Despedida' é a chance para dois atores

INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DE CINEMA

Filmes sobre alcoólatras costumam esbarrar em um inconveniente: a bebedeira é um estado que dota o sujeito de uma monotonia que fatalmente se transfere para os filmes sobre o assunto.
Cineastas como Billy Wilder ("Farrapo Humano") ou Blake Edwards ("Vício Maldito") não contornaram o problema.
Nem Mike Figgis, autor de "Despedida em Las Vegas", que foi indicado para os Oscars de melhor direção, roteiro, ator e atriz de 1995.
Figgis é um cineasta inglês com carreira nos EUA, que já havia mostrado talento, sobretudo em "A Outra Face do Crime" (Internal Affairs). Desta vez, a seriedade de seu trabalho passa por um modo de produção modesto como raramente se vê nos EUA (4 1/2 semanas de filmagem, hoje em dia, não é para qualquer um).
Passa por uma escolha feliz de ator: Nicolas Cage faz Ben, o escritor que troca Los Angeles por Las Vegas -onde sempre há bares abertos.
Seu projeto é simples: beber até morrer. O que surge em seu caminho é a prostituta Sera, aparentemente uma deusa do sexo.
Mas Sera (Elisabeth Shue) vive suas performances sexuais como uma atriz. Só na companhia de Ben se sentirá entrando na própria pele.
O que vem a seguir é a amarga relação entre dois seres marginais e enigmáticos. Ben topa morar com Sera, desde que ela cumpra o prometido: jamais intrometer-se entre ele e a garrafa mais próxima.
Figgis optou por um registro próximo ao do documentário: mostra quem esses seres são, como agem, sem nunca buscar uma psicologia que justifique suas existências, mas integrando-os à paisagem em que vivem.
Também na escolha do texto, a busca de autenticidade é clara: John O'Brien -autor do livro que o próprio Figgis adaptou- era um alcoólatra que morreu pouco tempo após assinar o contrato de venda dos direitos do livro (idéia que o cineasta recicla em uma das sequências do filme, quando Ben treme ao assinar um cheque).
Se "Despedida em Las Vegas" é exemplar pela integridade, deixa a sombra de alguma monotonia em sua evolução.
O que é compensado pelos dois surpreendentes atores. Nicolas Cage até hoje era famoso por seu parentesco com Francis Coppola. Elisabeth Shue, uma atriz apagada. Os dois dão um show no filme, tão mais completo quanto não estão lá para brilhar: são perfeitos e estritamente funcionais.

Filme: Despedida em Las Vegas
Produção: EUA, 1995, 110 min.
Direção: Mike Figgis
Com: Nicolas Cage, Elisabeth Shue, Julian Sands
Onde: cines Olido 1, Liberty e Iguatemi 2
Quando: a partir de hoje

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