São Paulo, segunda-feira, 11 de março de 1996
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Valadares quer prisão de banqueiros fraudulentos

FERNANDO GODINHO; LUCAS FIGUEIREDO
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O autor do requerimento que criou a CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) sobre os bancos, senador Antônio Carlos Valadares (PSB-SE), defende a prisão de banqueiros e funcionários públicos envolvidos em fraudes no sistema financeiro nacional.
Valadares conta que passou por cinco partidos (Arena, PDS, PFL, PST, PP) até chegar ao PSB, onde se sente "confortável". "Eu era uma figura provinciana", afirma o ex-prefeito de Simão Dias, no sertão sergipano.
Em entrevista à Folha, o senador defende a contribuição de bancos em campanhas eleitorais e avalia que a CPI só será instalada se o governo quiser.
Ele confirma que teve apoio do PMDB para criar a CPI. Para Valadares, o Proer -programa do governo de apoio às fusões bancárias- "é o jeitinho" brasileiro de ajudar os bancos.
Caso a CPI seja instalada, o governo FHC pretende ampliar as investigações para as administrações anteriores. A seguir, os principais pontos da entrevista:
Folha - O sr. acredita que a CPI do sistema financeiro será instalada?
Antônio Carlos Valadares - Depende muito do governo, que detém a maioria dos partidos. O governo afirma que o Plano Real ficaria em perigo. Acho que isto está acontecendo por duas razões: a continuidade da transferência em massa de recursos do Proer para os bancos e o fato de o governo espalhar boatos de que a CPI vai investigar todo o sistema financeiro. O governo está viabilizando a CPI com seu discurso e assombrando o mercado financeiro.
Folha - O sr. acha que o governo tem alguma coisa a esconder?
Valadares - Quando se diz que as investigações devem ser ampliadas, é da boca para fora. Querer mais, mais e mais é não querer apurar nada. Quando alguém do governo diz que deveria ampliar tudo, é balela. Não querem uma CPI limitada e nem ampliada.
Folha - O sr. já recebeu alguma contribuição de bancos em campanhas eleitorais?
Valadares - Nunca recebi. Se recebesse, teria feito o mesmo, ou seja, seria autor do requerimento da CPI. Se eu recebesse financiamento, seria legal. Se um banco sério quer financiar a campanha do nosso partido, não tem porque não aceitarmos. Nunca tive relacionamento com banqueiros, mas também não tenho raiva deles.
Folha - O sr. defende que banqueiros que fraudam o sistema financeiro sejam punidos com cadeia?
Valadares - Defendo uma legislação que corrija os artigos que permitem a fraude e que puna os culpados com cadeia.
Folha - Qual seria o alvo principal da CPI? As fraudes cometidas pelos controladores e diretores dos bancos ou a conduta das autoridades com relação às irregularidades?
Valadares - As duas coisas. A CPI vai apurar a responsabilidade civil e criminal de funcionários do governo e de gestores de bancos que tenham causado prejuízo à nação com a prática de fraudes. Também quer mudar a legislação para dar nova estrutura de fiscalização ao BC.
Folha - Ou seja, inclui cadeia para funcionários públicos?
Valadares - Sim. Para funcionários públicos que entraram em maracutaia, que foram omissos, que deveriam ter denunciado fraudes ao Ministério Público e não o fizeram.
Folha - O sr. ficou mais de uma semana colhendo assinaturas para a CPI, que só foi viabilizada com uma decisão de última hora do senador José Sarney (PMDB-AP), que liberou seus aliados. Como foi esta negociação?
Valadares - Fiquei surpreso ao colher 29 assinaturas de apoio (o mínimo é 27). Ninguém é criança a ponto de pensar que uma CPI poderia ser instituída no Senado sem o apoio dos grandes partidos. Mesmo porque o meu partido, o PSB, só tem dois senadores.
Folha - O que mais contribuiu para a criação da CPI?
Valadares - O depoimento de Gustavo Loyola, presidente do BC, não foi convincente. Ficou a dúvida de que o Proer foi criado para beneficiar o Nacional. Outro fator foi a ausência de Clarimundo Sant'Anna (ex-contador do Nacional), que engendrou a máquina fraudadora do Nacional. Ele não veio depor na CAE (Comissão de Assuntos Econômicos) do Senado e enviou uma carta considerada debochada. Então, demonstrei ao Gilberto Miranda (presidente da CAE) que aquilo era uma desmoralização com a comissão e com o Senado. Um homem que fraudou, enganou correntistas e investidores, que enrolou o BC, estava ali debochando da gente. Aí o Gilberto Miranda disse que ia assinar. E alguns companheiros dele assinaram.
Folha - O senador Gilberto Miranda também citou os mesmos motivos do sr., mas também listou elementos políticos, como insatisfação da base governista, proximidade das eleições municipais e reeleição presidencial.
Valadares - Aí é a política. E não vou entrar nessa área porque não sou do PMDB.
Folha - O sr. não tem receio de ser usado pelos partidos que querem a CPI com propósitos políticos contra o presidente Fernando Henrique?
Valadares - A CPI sendo instalada é bom para o país, é bom para o Senado.
Folha - O sr. acha que se corre o risco de o Senado e o governo perderem o controle sobre as investigações?
Valadares - O controle não será do governo, será do Senado. É a primeira vez na história do Brasil que o BC, que é uma verdadeira caixa-preta, está sob a ameaça de ser investigado. Nosso objetivo não é promover escândalos nem palanque para ninguém. É o de prestar um serviço ao país. Eu tanto acredito nessa CPI que aqui no Senado não existe nenhum candidato a cargo eletivo.
Folha - Nem o senador José Sarney, à presidência da República?
Valadares - Para mim, não interessa eleição de A ou B. Os senadores que assinaram o requerimento me disseram que não tinham objetivos políticos.
Folha - O PSB não pode indicar representantes na CPI por não ter número suficiente de senadores. O sr. vai ficar de fora?
Valadares - Do ponto de vista regimental, eu até poderia ficar de fora. Mas dois partidos se ofereceram para indicar o meu nome, entre eles o PDT.
Folha - O sr. vai conseguir projeção com a CPI?
Valadares - Sou avesso à publicidade. Se isso me projetar, meus eleitores ficarão satisfeitos. Mas a intenção não é esta. Se isso projetar o Senado, fico satisfeito.

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