São Paulo, quarta-feira, 13 de março de 1996
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Cássia Eller mostra potência de voz e violões

PEDRO ALEXANDRE SANCHES
DA REDAÇÃO

O quarto disco de Cássia Eller vem atender a uma necessidade expressa desde sua estréia em disco, em 1990: a do lançamento de um disco ao vivo da cantora.
Se discos ao vivo costumam pouco acrescentar às carreiras dos artistas que os lançam, no caso de Cássia a coisa é diferente. Ela é daqueles artistas que no palco escancaram tudo aquilo que apenas insinuam em discos de estúdio.
"Ao Vivo" foi gravado durante a última turnê da artista, "Violões". Constitui-se exclusivamente da voz potente de Cássia e de três violões -o seu, o de Walter Villaça e o de Luciano Maurício.
Se o alto volume da voz da cantora chega a parecer maneirismo em disco, só num show pode-se perceber que ela canta sem o mínimo esforço, com a voz que a natureza lhe deu. É claro que um CD, mesmo ao vivo, não demonstra isso plenamente -é preciso ver Cássia Eller.
Por isso, "Ao Vivo" é, ainda, decepcionante para quem assistiu ao show. Resta o (belo) consolo de versões tão simples quanto pungentes das canções de Cássia, realçadas pelos arranjos de violões.
A maior parte das canções foi retirada de seu último -e mais bem-sucedido- disco, de 94. Destacam-se "E.C.T." (de Nando Reis, Marisa Monte e Carlinhos Brown), "Na Cadência do Samba" (de Ataulfo Alves), "Coroné Antônio Bento" (do primeiro disco de Tim Maia, aqui mixada a "O Gosto do Amor", de Gonzaguinha, não-creditada no disco) e "Malandragem" (Cazuza/Frejat).
O compositor dominante é Renato Russo: entram "Por Enquanto", "Música Urbana 2" e "1º de Julho", em que Cássia se firma como única intérprete capaz de subtrair o messianismo do autor.
Fermentada para a música nos negros anos 80, Cássia faz questão de reafirmar que preza suas origens. O faz retransformando e conferindo significados ao rock de crise e impasse que fez a década de 80.
As melhores surpresas aparecem mesmo nas canções inéditas na voz de Cássia. É o caso de "Eu Sou Neguinha", entrada da cantora no repertório de Caetano, ou "Socorro", antes gravada por Skowa.
"Não Amo Ninguém" (Frejat/Cazuza/Ezequiel Neves) é transformada em blues de raiz por sua voz negra, em leitura extremamente sexualizada. A única inédita é "Nenhum Roberto", de Nando Reis, homenagem emocionada -e algo pretensiosa ("Não sou nenhum Roberto/ Mas às vezes eu chego perto")- a Roberto Carlos.
Mas nada se compara a "Nós", de Tião Carvalho, do repertório de Ná Ozzetti. É o instante de genialidade do disco, ainda que apenas pálida reprodução do que Cássia pode fazer em pessoa, razão suficiente para quem perdeu o show chorar de arrependimento -ou ir até o teatro Rival, no Rio, onde ela inicia nova temporada amanhã.

Disco: Ao Vivo
Artista: Cássia Eller
Lançamento: Globo/Polydor
Preço: R$ 18 (o CD, em média)

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