São Paulo, sábado, 16 de março de 1996
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O futuro do emprego nas montadoras

MIGUEL JORGE

Os males do desemprego estrutural que aflige quase todas as economias do mundo tornam necessárias soluções coletivas que unam governos, empresas e trabalhadores. Será preciso estimular já o aumento da oferta de emprego, pois o mundo entrará no novo milênio com 900 milhões de desempregados, segundo a Organização Internacional do Trabalho -OIT. As empresas industriais não terão como absorver nem 10% desse contingente.
O advento de tempos difíceis mesmo nas economias mais prósperas impõe às indústrias, sobretudo no setor automotivo, sacrifícios severos, pois a globalização da economia é crescente e ininterrupta.
Acompanha o processo a necessidade de o setor enfrentar inúmeros desafios -redução dos custos (prioridade de 81% das grandes empresas brasileiras), novas formas de gestão e processos produtivos, mais produtividade etc.
Na Alemanha, com 9,9% de desemprego em janeiro e onde se estima desemprego de 4 milhões de pessoas no ano 2000, os fabricantes de veículos admitem até transferir-se para o exterior se não houver profundas mudanças nas políticas econômica, social e salarial.
Sem diminuir as reivindicações salariais, a carga tributária sobre a produção de outros incentivos ao emprego, o setor poderá cortar mais de 100 mil postos de trabalho até a virada do século.
Nos EUA, no mês passado, as gigantes GM, Ford e Chrysler fecharam 19 fábricas no país, Canadá e México por períodos mínimos de uma semana, com prejuízos para os trabalhadores.
Na França, com taxa de desemprego de 11,7% em janeiro (a mais alta desde abril de 1995), mantém-se o círculo vicioso: o governo não incentiva a criação de empregos e as empresas não abrem postos de trabalho.
Como ficará o emprego na indústria automobilística -mola propulsora do progresso econômico- num mundo em que o trabalhador terá cada vez menos chances de obter um emprego com vínculos de segurança, como a carteira de trabalho?
O setor poderá oferecer mais empregos numa nova sociedade, de alto impacto tecnológico, inovações na produção, mais produtividade e competitividade, mas no qual as estruturas produtivas terão de ser menores, mais enxutas e bem mais eficientes?
Essas são questões graves quando se sabe que, agora, entramos num período de profundas mudanças na produção industrial -período nervoso, competitivo, especializado e, assim, difícil de criar os empregos necessários.
Se, antes, mais produção era contrapartida obrigatória à oferta de emprego, hoje produz-se mais com menos empregos.
O exemplo do ABC paulista é emblemático. Como a região concentra as grandes montadoras, reflete bem o processo deflagrado antes do Real, mais exatamente no final dos anos 80, quando se previa a queda de nossas fronteiras econômicas.
Desde então, a estruturação das empresas -redução sensível de estruturas hierárquicas e de escalões de decisão- tornou-as mais enxutas e ágeis. Nos próximos anos, se manterá, pelo menos enquanto durar o atual processo de enxugamento da indústria automobilística, que objetiva manter alto seu nível de competitividade.
Conforme recentes pesquisas do IBGE, de 1994 para 1995 caiu a proporção de pessoas ocupadas que não têm instrução, assim como as que cursaram da primeira à terceira séries do primeiro grau.
O mercado de trabalho cresce, especialmente na área de serviços, mas só para quem tem maior qualificação.
A tarefa de criar mais empregos na indústria automobilística, portanto, é de todos os setores envolvidos, não apenas porque eles carregam o maior peso do desemprego estrutural, mas também porque têm os meios para minorar seus efeitos -investimentos, técnicas, pessoal etc.
Um dos requisitos para que isso ocorra, obviamente, é a estabilização econômica do país, que está sendo alcançada com o sucesso do plano de estabilização econômica, que recuperou o poder de compra dos salários.
É essa estabilização e uma melhor distribuição da riqueza nacional que trarão outras montadoras, fabricantes de autopeças e componentes e investimentos em outros setores, aumentando a oferta de empregos industriais.
Com a aprovação das várias reformas estruturais necessárias, o Congresso poderá dar enorme contribuição a esse processo. A privatização, com atração de investimentos internos e externos, por sua vez, certamente terá papel importante na geração de mais empregos -não se duvide da capacidade de expansão das áreas de telecomunicação, portos, estradas etc.

Mguel Jorge, 50, jornalista, é vice-presidente da Anfavea (Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores) e vice-presidente de Recursos Humanos e Assuntos Corporativos da Volkswagen do Brasil.

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