São Paulo, sábado, 16 de março de 1996
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'Noviças' não é 'A Bofetada', mas diverte

NELSON DE SÁ
DA REPORTAGEM LOCAL

Pode ser frustrante, para quem espera a segunda edição do fenômeno de "A Bofetada". O musical "Noviças Rebeldes", da mesma Cia. Baiana de Patifaria, não tem o impacto, nem é tão engraçada, não mostra a liberdade selvagem da produção anterior.
Mas há compensações, novas qualidades. A maior delas, logo evidente, é a preparação dos atores para o canto. Nos poucos musicais que aparecem em São Paulo -em maior número, é bom notar, na atual temporada- é raro um elenco assim coeso.
Com um certo destaque, talvez, para Diogo Lopes Filho, os patifes respondem com igual competência por um gênero que, até meses antes da estréia em Salvador, acompanhada pelo crítico, não dominavam, mal conheciam.
Então, prepare-se, quem for assistir, para apreciar mais do que o escracho dos patifes. Prepare-se para apreciar, por exemplo, um belo quadro musical como "Virando Católica", de Irmã Maria José, ou Wilson dos Santos.
Mas que ninguém também se desespere, o escracho segue lá, o besteirol que a Cia. Baiana de Patifaria reinventou, quatro anos atrás, com "A Bofetada".
E, assim como aquela primeira produção -na realidade, a segunda, já que "Abafabanca" veio antes, mas foi restrita à Bahia- consagrou Lelo Filho, esta consagra mesmo Wilson dos Santos.
Ele faz Irmã José, uma freira de passado questionável, que faz o que pode para tomar parte do musical-dentro-do-musical. Aliás, a trama: cinco freiras resolvem montar um musical para arrecadar dinheiro, já que não têm como enterrar outras quatro, que morreram depois de tomar uma canja feita "com legumes enlatados".
O musical é o musical das freiras, na verdade pouco mais do que uma revista, uma sequência de esquetes cômicos e quadros musicais, sem ligação maior entre eles.
Irmã José é o arlequim da peça, a Olímpia -em vez de empregada, a motorista do convento- com liberdade para os palavrões, as imitações, as insinuações obscenas, até um strip-tease desajeitado.
Wilson dos Santos domina de tal maneira o público que no fim da apresentação já arranca reações com o olhar.
Mas o que ele tem de liberdade iconoclasta os demais têm de contrição. Lelo Filho, em especial, que faz a Irmã Amnésia.
A tragédia com Moacir Moreno, grande comediante, violento, arrebatador em "A Bofetada", Moacir a quem ele mesmo agradece por "Noviças Rebeldes" no programa, marcou o humor de Lelo Filho, além de desfazer o elenco anterior.
Mas a Irmã Amnésia e as demais, deixando Irmã José de fora, enfrentaram sobretudo o autor Dan Goggin, católico e rigoroso.
Diante de uma montagem com elenco masculino, a primeira no mundo, entre produções de 26 países, até o momento, Goggin disse que ela só teria validade se os atores evitassem os tipos, criassem as personagens de fato, freiras, sem cair nos cacos e no pastelão.
Ótimo para o orgulho do autor e para sua Igreja Católica, que consegue um elogio público no Brasil, o que é cada vez mais raro. Nem tanto para os patifes e a comédia.
(Por fim, vale dar a informação, diante do espanto da platéia, na estréia: o esquete com a freira desbocada, um boneco manipulado por Irmã Amnésia, é da montagem original, sendo que o quadro do programa de televisão é cópia dele e não o contrário.)

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