São Paulo, quarta-feira, 20 de março de 1996
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Já estão apelando

JANIO DE FREITAS

Paulo Maluf recusa um ministério para o seu partido e repele o método "é dando que se recebe" ofertado por Fernando Henrique, desejoso de receber a ajuda do PPB contra a CPI dos Bancos. Quem imaginaria, apenas um tempinho atrás, esses dois personagens vivendo tais papéis?
Os surpreendidos por este episódio não estão, porém, em situação singular. O próprio Fernando Henrique e seu círculo íntimo estão vivendo surpresa equivalente. Inundados de pretensão e suficiência, ambas revestindo uma falta assombrosa de sensibilidade política, nem de longe supunham que José Sarney tivesse força e disposição para reagir até ao ponto de encostar Fernando Henrique e o governo na parede da CPI que tanto temem.
Nos compassos iniciais do episódio, foi dito aqui que as coisas não seriam mais as mesmas entre a Presidência, ou o governo, e o Congresso. Fernando Henrique e Sérgio Motta disseram, fizeram, mandaram dizer e fazer o que quiseram, contra parlamentares em pessoa e contra o Congresso em geral. Não é provável que deixem inteiramente de fazê-lo, porque a persistência dos ataques e provocações denuncia uma ação deliberada. Mas, no mínimo, daqui para a frente serão mais cautelosos, na certeza de que não têm a força presumida.
O argumento lançado por Sérgio Motta lá de Nova York, sempre na linha de temor da CPI, já se inscreve no gênero das apelações -o que é nítido sinal de rabo entre as pernas, para usar uma expressão adequada à linguagem habitual do ministro. Essa história de que a CPI traria instabilidade econômica e esta acarretaria o fim da democracia, com a volta do autoritarismo, é o besteirol em dose dupla.
Na primeira, supondo-se que Sérgio Motta insinue golpe militar, embora não cite os militares, a hipótese a ser considerada é a oposta à sua. Ou seja, o que pode provocar um problema de origem militar é a continuação excessiva, como método antiinflacionário, dos cortes nos gastos governamentais indispensáveis, da demolição da máquina administrativa e do patrimônio do Estado, do aumento do desemprego e demais realizações do atual governo.
Na segunda dose do besteirol, a falta de menção aos militares sugere que "a volta do autoritarismo, provocado pela volta da inflação", aconteceria como uma das possíveis formas de fujimorização. A idéia fixa de Fernando Henrique, expressa nas constantes referências a Pinochet, Fujimori e às facilidades governamentais proporcionadas pelo autoritarismo, já foi observada e registrada por muita gente. Mas não se corre nem o mais remoto risco de alguma coisa no gênero. Sem apoio militar, nada feito. E o apoio militar a Fernando Henrique só dá, quando muito, para a associação em torno de um negócio tipo Raytheon.
O argumento de Sérgio Motta é tão honesto quanto a lengalenga de que a CPI, ao examinar o acontecido entre o Banco Central e os bancos que estouraram em 95, abalaria o sistema financeiro e poria em risco a estabilidade.

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