São Paulo, domingo, 24 de março de 1996
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Isolamento dificulta o ensino em Pauini

ANDRÉ MUGGIATI
DA AGÊNCIA FOLHA, EM PAUINI (AM)

O menino Lázaro Chaves Rashid, 11, põe sua canoa diariamente nas águas do rio Purus, na Floresta Amazônica, para ir remando à escola no vilarejo de Alegrete, onde a aula começa às 7h30.
Ele cursa a 2ª série e tenta vencer o analfabetismo que atinge 81,23% dos adolescentes no município onde mora, Pauini (950 km a sudoeste de Manaus), no Amazonas. É o pior índice do Brasil.
Os principais fatores que levam a essa situação saltam à vista: o isolamento da população na selva, a falta de recursos para a educação e a péssima formação dos professores.
Com uma área de 42 mil km2 (28 vezes mais que o município de São Paulo), Pauini tem 17 mil habitantes. Cerca de 65% da população vive na zona rural, basicamente nas margens dos rios Purus e Pauini.
A índia apurinã Jaqueline dos Santos, 10, por exemplo, mora sozinha com a mãe, Maria Avelino dos Santos, nas margens do igarapé Preto. Ela não estuda: a escola mais próxima fica a mais de uma hora de distância a remo.
Não há estrada em Pauini. Os povoados mais longínquos ficam a três dias de barco da sede da cidade, onde há cinco escolas. Das 72 da zona rural, 20 não têm prédio. Na sede do município, faltam vagas para quem quer aprender a ler.
A escola estadual Frei Mário Sabino tem 120 crianças aguardando turmas de alfabetização.
A prefeitura diz que aplica 25% de seu orçamento em educação. A receita municipal, porém, ficou em minguados R$ 200 mil em fevereiro. Assim, o gasto médio por aluno ao ano não passa de R$ 181.
Falta de professores Não há professores suficientes. O último concurso para a contratação tinha apenas 37 candidatos para 49 vagas. "Se houvesse pessoas para lecionar e alguém pagasse, teríamos mais quatro classes de alfabetização", disse o diretor da escola, Jair Cardoso de Matos.
As escolas rurais têm uma única classe para as quatro primeiras séries. Na sede, as escolas têm todas as séries do 1º grau. O 2º grau formou a primeira turma em 1995.
Mas é fácil achar crianças que não sabem ler ou escrever depois de três ou quatro anos na escola.
A índia apurinã Valdeniza dos Santos, 15, da comunidade do rio Preto, a 30 minutos de barco da cidade, vai à escola há três anos. Só aprendeu a escrever o nome.
O prefeito de Pauini, José Vicente Amorim (PFL), nega que o município tenha 81,23% de analfabetismo entre 15 e 17 anos.
"É mentira. Na faixa etária apontada, aliás, o índice é zero. O IBGE não fez o recenseamento, não visitou as comunidades rurais." O prefeito empurra a responsabilidade pelo analfabetismo: "Se os alunos não aprendem, a culpa é do professor, pois a prefeitura faz sua parte".

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