São Paulo, domingo, 24 de março de 1996 |
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Isto é o Brasil
LUÍS NASSIF O mais importante personagem político da história do país nasceu há pouco mais de 15 anos e vive profunda crise de adolescência.Chama-se moderna opinião pública -um objeto não de todo identificado, que tem na mídia sua forma de expressão oficial (mas não única). A criança começou a a ser parida em fins dos anos 70, reagindo contra o regime militar de arbítrio. Deu os primeiros passos na campanha das diretas, o primeiro berro (e o primeiro choro) com o Cruzado e, aos poucos, sedimentou uma série de conceitos éticos importantes -que ajudaram, inclusive, na derrubada de um presidente da República. Com a façanha, ganhou maioridade sem ter completado o amadurecimento. Tem participação cada vez mais relevante nos rumos do país, mas a cabeça continua instável como a de um jovem. Quer a modernidade, mas não tem certeza, na verdade não sabe direito que história é essa, mas é a favor, genericamente, sendo contra no particular, porque a modernidade é o neoliberalismo, que é anti-social, embora o paternalismo seja condenável... Sacou, bicho? Encanta-se com uma paixão hoje, com outra amanhã -sendo absolutamente fiel às duas. É capaz de crucificar o funcionário público, por supostas regalias, e, logo em seguida, crucificar o governo por tentar suprimir as regalias do funcionário público. Como todo adolescente, têm momentos de indignação, mas não tem a menor idéia sobre o que fazer com isso, pois a inexperiência impede-o de estabelecer claramente relações de causa e efeito, ou de identificar saídas objetivas para os problemas. É extremamente suscetível ao patrulhamento. Se a "rapeize" acha de bom tom criticar, critica-se. Se não é de bom tom criticar, não se critica. Ir contra a "tchurma", jamais. Rede de intrigas A catarse em torno do caso do Banco Nacional foi o exemplo mais acabado dessa postura adolescente, à la "mancha verde". No geral, a reação da mídia foi uma paródia ao comportamento do ator Peter Finch no filme "Rede de Intrigas" -aquele anchorman enlouquecido, que vai para a frente do vídeo e coloca o país inteiro a gritar das janelas das casas: "Estou morrendo de raiva, estou morrendo de raiva!". Está bem, cara pálida, mas pense em algo de útil para fazer com sua raiva. Nesses momentos, sempre assoma fatal herança luso-brasileira-cucaracha, o palavrório infindável, a disputa por adjetivos, a milonga, sem nenhuma preocupação com objetivos concretos. Reformas, segurança dos correntistas, estabilidade, mudanças estruturais no sistema financeiro, na Lei das Sociedades Anônimas, na legislação penal, nada disso importava. A palavra de ordem era a CPI, como se sua instauração pudesse ser objetivo final do que quer que fosse. O que se esperava dela? Que contribuísse para mudanças institucionais? Que tornasse o Banco Central mais eficiente, o Ministério Público mais ativo e a Justiça menos morosa? Que permitisse mudanças institucionais que prevenissem o aparecimento de novos problemas? Nada disso. Discutir tecnicamente a questão não dá Ibope, não demonstra para o leitor nossa ardente solidariedade com sua indignação. O que se queria era combustível para o paroxismo, entranhas reviradas, escândalos sendo revelados ou fabricados, o perigoso Clarimundo numa cela comum, procuradores federais exibindo a presa e se comportando como valentões de bar, chutando um leão reumático. Emoção pela emoção, como convém a um vibrante adolescente. Resultados A CPI não saiu e também não resultou em nenhuma mudança estrutural concreta, porque em nenhum momento se teve o senso prático de canalizar a raiva para algo de minimamente útil. De objetivo, a indignação que explodiu com o caso Nacional serviu unicamente para o seguinte: 1) atrasar as reformas encaminhadas ao Congresso; 2) tornar mais caro o passe de políticos fisiológicos; 3) obrigar o governo a recorrer a práticas fisiológicas (quem condena as práticas queria o quê? Que se pagasse para ver o país pegando fogo?); 4) no início do processo tinha-se um presidente arrogante, que precisava baixar o topete. Agora, tem-se um presidente com sua autoridade arranhada, porque deixou-se na opinião pública a falsa impressão -porque não fundada nem em fatos nem na lógica- de que beneficiou parentes. Sugere-se que no próximo acesso de raiva coletiva haja a maturidade mínima para uma indagação fundamental: como transformar essa raiva em algo de útil para o país. Texto Anterior: Gasto com servidor é arma retórica Próximo Texto: Das S/As em todo o país, só 4,4% têm ações nas Bolsas Índice |
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