São Paulo, terça-feira, 26 de março de 1996
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C'EST INCROYABLE!

A menos que ocorra algum cataclismo, os turistas que visitam o rio Amazonas ou o Pantanal mato-grossense sabem que lá estarão à sua espera todas as paisagens que no passado já atraíram outros visitantes.
Porém, é de uma ironia aterradora que um dos novos pontos fixos de atração turística no Rio de Janeiro seja agora, além do Cristo Redentor e do Corcovado, a favela da Rocinha, como mostrou reportagem publicada nesta Folha no último domingo.
Há poucos anos, talvez nem o mais desvairado ficcionista ousasse simular o cenário flagrado pela foto de capa, do qual fazem parte tanto o que há de socialmente mais dramático no Brasil quanto o que aparentemente está mais distante do flagelo que vitima os favelados. De um lado, descamisados em meio a monturos. De outro, saudáveis turistas em jipes de guerra. Dois mundos, contemplando-se um ao outro no mais perfeito estranhamento, num país que ainda almeja alcançar a modernidade.
"C'est incroyable!", exclamam os franceses durante a excursão. Mais inacreditável (talvez pensem alguns brasileiros) é que essa cena já faça parte de um roteiro turístico, isto é, de um conjunto de cenários que previsivelmente os turistas encontrarão por aqui nos próximos anos, quiçá décadas, infelizmente. É sabido que o chamado "custo Brasil" é, em larga medida, um dos responsáveis pela produção de certas aberrações sociais. Mas estas, ao se eternizarem na paisagem brasileira, passam a constituir terríveis obstáculos a que o país possa algum dia de fato enxergar-se como moderno.

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