São Paulo, terça-feira, 26 de março de 1996
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Trinta anos de PMDB

GERARDO MELLO MOURÃO

24 de março. A data talvez venha a ser no futuro nome de rua nas cidades do país. Foi o dia da fundação do MDB, hoje PMDB, que acaba de celebrar, aos trancos e barrancos, a convenção nacional que comemorou seus 30 anos.
É o partido nacional de maior longevidade na história da República. Na vida de um partido político brasileiro essa longevidade é um fenômeno histórico. Os governadores e os outros, com o Brito do Rio Grande à frente, ainda vão ser enterrados antes do partido de que se serviram para ser eleitos e que já viu crises piores. É possível que esses governadores nunca tenham lido um livro de história política do Brasil.
O episódio convida a algumas reflexões, tanto para seus militantes como para seus adversários. Até porque, no Brasil, os partidos são em geral apenas uma sigla oportunista e efêmera, montada para aventuras episódicas, sem outra prestância senão a de atender o processualismo da lei eleitoral que viabiliza candidaturas, de vereadores a presidentes.
A longa idade do PMDB deve, por isso mesmo, ser saudada por gregos e troianos como um acontecimento positivo em nossa vida democrática.
É certo que há cassandras incuráveis, como o ministro Nelson Jobim, que acham que o partido que chegou aos 30 anos como o maior do país não tem mais futuro. Mas esse é o juízo de um político em fase terminal, que viu frustradas suas ambições pessoais, certamente legítimas, como as de qualquer homem público de boa qualificação.
O doutor Jobim não logrou ser presidente da Câmara nem alcançou a liderança da bancada que merecia e fracassou estrondosamente na tarefa maior que lhe foi confiada na reforma constitucional que não reformou nada.
Sua presença no Ministério da Justiça apagou as funções tradicionais da pasta -coordenação política do governo- de que foram capazes antecessores seus mais brilhantes e eficientes, até nos dias rígidos do governo militar, como Armando Falcão e Petrônio Portela.
Sem falar na excepcional presença política, moral e cultural de seu conterrâneo Paulo Brossard no governo Sarney. O que consta hoje é que graças ao PMDB trintão o doutor Jobim chegará ao Supremo Tribunal Federal, que há de iluminar com suas luzes de Ulpiano dos Pampas.
Conservo numa velha pasta um monte de papéis das reuniões que o exército brancaleone dos parlamentares salvos das primeiras cassações promoveu na casa do senador pernambucano Barros Carvalho, líder do governo deposto de João Goulart, para decidir sobre a fundação de um partido de oposição.
Foram sugeridos 22 nomes para a nova legenda. Recolhidos pelo senador Nogueira da Gama, adotou-se finalmente o nome proposto pelo senador Barros Carvalho: Movimento Democrático Brasileiro.
Pai ou padrinho de batismo da legenda, o senador deixou claro não se tratar propriamente de um partido acadêmico, mas de uma "frente", um movimento de resistência democrática contra a ditadura militar. Não era um partido. Era um "melting pot" de militantes vindos principalmente do PSD e do PTB, mas também do PSP, dos pequenos partidos de esquerda e até da UDN.
Desde o primeiro momento o MDB caracterizou-se logo como uma oposição democrática, dura e intransigente, o que lhe custaria cassações, prisões e exílios de seus parlamentares -inclusive este pobre escriba. Foram tempos belos e românticos, de luta pela restauração dos direitos constitucionais.
Esse é um crédito que a história há de consignar ao MDB, partido que foi o protagonista maior da mobilização nacional pela volta do país à ordem democrática. Quando a legenda do MDB assumia já proporções significativas, como capital de giro da oposição, o governo militar, num golpe tolo, o obrigou a mudar de nome, decretando que em todas as legendas políticas devia constar a palavra "Partido". Em vez de MDB, passaria a se chamar PMDB.
O PMDB cometeu erros desastrosos em sua acidentada história. Um deles foi quando trocou a candidatura do bravo e competente senador Magalhães Pinto pela opção infantil do nome de um general de pijama. Outro desastroso gesto foi adotar a candidatura do sr. Tancredo Neves, já uma vez trânsfuga de suas fileiras, que abandonara para ser fiel nada menos que ao notório sr. Chagas Freitas. Com esse tipo de companheiro tentou destruir o PMDB, fundando o PP, de saudosa memória.
O leme do partido está hoje nas mãos limpas e firmes do deputado Paes de Andrade, um de seus fundadores. O que dele se espera não há de ser uma adesão cabisbaixa e interesseira nem uma contestação arrogante ao governo, mas um contraponto altivo, cavalheiresco e independente, para que o PMDB, adulto e maduro, encontre também o seu caminho para o poder.

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