São Paulo, terça-feira, 26 de março de 1996
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Neruda volta ao Brasil

HERALDO MUÑOZ

Pablo Neruda teve uma especial relação com o Brasil. O grande poeta chileno visitou e admirou em várias oportunidades cidades brasileiras como Rio de Janeiro, Petrópolis, Belo Horizonte, Ouro Preto, Brasília, Salvador e São Paulo; conheceu seu povo; percorreu suas ruas e mercados e, em companhia de amigos brasileiros, frequentou restaurantes e cafés para conversar e compartilhar sonhos, idéias e esperanças.
Maravilhado com as cores, contrastes e belezas da paisagem brasileira, Neruda ficou francamente cativado por seu povo e por seus grandes intelectuais e artistas. Especialmente importante na vida de Neruda foi sua estreita amizade com figuras máximas da arte e da cultura do Brasil, incluindo Jorge Amado, Di Cavalcanti, Roberto Burle Marx e, talvez seu melhor amigo brasileiro, o poeta Vinicius de Moraes.
Com Vinicius Neruda percorreu cidades brasileiras, cruzou selvas e rios, discutiu literatura, degustou a comida local, desfrutou de muitos e bons vinhos chilenos; e, também com ele, conheceu o afeto da mulher brasileira.
Essa amizade tão especial levou Vinicius a publicar, em 1974, o livro-homenagem ao poeta chileno intitulado "História Natural de Pablo Neruda". Essa jóia literária, com versos de Neruda a Vinicius e deste a Neruda, teve em sua edição original uma tiragem muito reduzida, não-comercial, deixando de receber naquela oportunidade o reconhecimento amplo que merecia.
Hoje, por ocasião da visita ao Brasil do exmo. presidente da República do Chile, Eduardo Frei, o poeta chileno volta à terra brasileira. Neruda retorna, primeiro, por meio da reedição em 500 exemplares numerados do magnífico trabalho de Vinicius de Moraes, o qual será lançado, com o apoio do governo da Bahia, na abertura do "Primeiro Encontro da Cultura Brasil-Chile", no dia 27 de março em Salvador.
Neruda volta ao Brasil também presente nas atividades culturais do renomado escritor chileno Antonio Skármeta, autor do livro "O Poeta e o Carteiro" e do roteiro do filme do mesmo nome. Skármeta participará, no contexto da visita do presidente Frei, de encontros de escritores chilenos e brasileiros na Bahia, no Rio e em São Paulo, ocasião em que seu livro sobre Neruda será relançado em português.
Mas, sobretudo, Neruda retorna à terra brasileira que tanto admirou e ao contato com o povo que tanto apreciou por meio de uma mostra da coleção de seus objetos pessoais reunidos pela Fundação Neruda para uma exibição especial no Museu de Arte de São Paulo (Masp). Ali estarão as primeiras edições de seus livros, carrancas de proa, fotografias e outros valiosos objetos que pertenceram ao vate chileno, incluindo a medalha do Prêmio Nobel de Literatura que recebeu em 1971.
O Brasil, e concretamente São Paulo, poderá apreciar esses objetos graças à excepcional autorização outorgada pela Fundação Neruda para apresentar essa mostra fora do Chile; à generosa hospitalidade do Masp; ao apoio de várias empresas chilenas e brasileiras e à organização a cargo do Conarte, do Ministério das Relações Exteriores do Chile, da Embaixada do Chile e do Ministério da Cultura do Brasil.
O trabalho conjunto chileno-brasileiro para a montagem da mostra "Neruda no Brasil", que será inaugurada pelo presidente do Chile hoje, às 20h, reflete e honra, sem dúvida, a memória do afeto que Neruda sentiu por seus grandes amigos brasileiros.
Uma vez Pablo Neruda escreveu em sua bela "Ode a uma manhã do Brasil" que, ao despertar o dia, se sentia "dentro de um violento diamante", com "toda a transparência da terra" materializando-se diante de seus olhos e que, ao chegar a noite, "o tempo se detinha e tudo entrava em sua 'caixa de diamante"'.
Hoje, novamente o dia amanhece no Brasil para Neruda, recordando-se sua vida e obra na significativa exposição do Masp e nas outras atividades já mencionadas da visita presidencial, que renovam a amizade entre os povos do Brasil e do Chile, e que Pablo Neruda cultivou com paixão e alegria.

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