São Paulo, sábado, 6 de abril de 1996 |
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SAUDADE Certos mitos são repetidos tantas e tantas vezes que muitos acabam se convencendo de que eles são de fato verdadeiros. Um desses casos é o que envolve a palavra "saudade", que seria uma exclusividade mundial da língua portuguesa. Trata-se de uma grande e pretensiosa balela. Todas as línguas do mundo exprimem com maior ou menor grau de complexidade todos os sentimentos humanos. E seria uma grande pretensão acreditar que o sentimento que batizamos de "saudade" seja exclusivo dos povos lusófonos. Embora línguas que nos são mais familiares como o inglês e o francês tenham de recorrer a mais de uma expressão (seus equivalentes de "nostalgia" e "falta") para exprimir o que chamamos de saudade em todas as circunstâncias, existem outros idiomas que o fazem de forma até mais sintética que o português. Em uma de suas colunas semanais nesta Folha, o professor Josué Machado lembrou pelo menos dez equivalentes da palavra "saudade". Os russos tem "tosca"; alemães, "Sehnsucht"; árabes, "shauck" e também "hanim"; armênios, "garod"; sérvios e croatas, "jal"; letões, "ilgas"; japoneses, "natsukashi"; macedônios, "nedôstatok"; e húngaros, "sóvárgás". Pode-se ainda acrescentar a essa lista o "desiderium" latino, o "póthos" dos antigos gregos e sabe-se lá quantas mais expressões equivalentes nas cerca de 6.000 línguas atualmente faladas no planeta ou nas 10 mil que já existiram. Ora, se até os cães demonstram sentir saudades de seus donos quando ficam separados por um motivo qualquer, seria de um etnocentrismo digno de fazer inveja à Alemanha nazista acreditar que esse sentimento é próprio apenas aos que falam português. Desde que o homem é homem, ou talvez mesmo antes, ele sente saudade; desde que aprendeu a falar aprendeu também, de uma forma ou de outra, a dizê-lo. Texto Anterior: PALADINO DA DEMOCRACIA Próximo Texto: François e Fernando Índice |
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