São Paulo, domingo, 7 de abril de 1996
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Raoni ameaça provocar guerra no Xingu

EMANUEL NERI
DA REPORTAGEM LOCAL

A morte de Umoro, 30, o filho mais velho do cacique Raoni, gerou uma crise sem precedentes entre os índios que vivem na região do Xingu, no Mato Grosso.
Os caiapós metuktire, tribo de Raoni, poderão declarar guerra a outros índios do Xingu.
Umoro, que tinha epilepsia, era acusado de ter morto dois índios em sua aldeia, há quase dois anos. Por isso, Raoni mandou que ele morasse no Parque do Xingu, a quase 500 km da reserva Capoto Jarina, dos caiapós.
No último dia 16 de janeiro, Umoro foi encontrado morto em um rio próximo à Base Jacaré, no Parque do Xingu. Há duas versões sobre sua morte. Raoni, segundo seu sobrinho, Megaron, suspeita de feitiçaria e homicídio.
A outra versão é do pajé Tacumã, da tribo camaiurá, onde Umoro morava. Segundo Kotok, filho de Tacumã, Umoro saiu sozinho para pescar, teve um ataque epilético e morreu afogado. "Raoni sabe que Umoro tinha problemas de saúde", disse Kotok.
Raoni
Raoni é o índio brasileiro mais conhecido dentro e fora do país. Amigo do roqueiro inglês Sting, visitou vários países fazendo palestras sobre os caiapós. A morte do filho o deixou arrasado.
Com a cabeça raspada, em sinal de luto, não quis dar entrevistas. Desde a morte, Raoni transmitiu interinamente a função de cacique para um sobrinho, Wai-Wai. Segundo Megaron, Raoni tem motivos para suspeitar de assassinato.
O primeiro: os camaiurás não o avisaram da morte. Ao ficar sabendo, três dias depois, foi em busca do filho e achou o corpo boiando num rio. "Por que os camaiurás não tentaram encontrar o corpo de Umoro?", diz Megaron.
Para Megaron, há uma outra suspeita. Segundo ele, havia um golpe profundo no rosto de Umoro: "Parecia com flechada ou bala". Megaron administra um posto da Fundação Nacional do Índio em Colider (MT).
Na época da morte, Megaron foi chamado para apaziguar os ânimos dos caiapós, que estavam em pé de guerra. No mês de maio, quando sair do luto, Raoni vai fazer uma pajelança no local onde o corpo do filho foi encontrado, para descobrir a causa da morte.
"Os pajés vão fumar. Se descobrirem que foi morte provocada, vai haver vingança", diz Megaron. "Índio faz justiça com as próprias mãos." Os caiapós, com quase 600 índios, são considerados os maiores guerreiros da região do Xingu.
Camaiurás
Diversamente dos caiapós, os camaiurás são pacíficos. Adoram dançar e praticar esportes. O huka-huka, uma luta corporal, é sua diversão preferida. Eles somam 300 índios, metade dos caiapós.
Para os camaiurás, não há motivos para suspeita de homicídio. "Nós todos gostávamos muito dele", diz Kotok. Seu primo, Amanua Seus, que preside a Associação Indígena Mavutsinin, desafia Raoni: "Se há alguma suspeita, nós poderíamos pedir a necropsia".
Sertanistas e antropólogos ouvidos pela Folha não acreditam na versão de homicídio. Para eles, a morte deve ter sido por afogamento, após um ataque de epilepsia.

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