São Paulo, domingo, 7 de abril de 1996
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A Lei de Concessões e o direito de parceria

IVES GANDRA DA SILVA MARTINS

Transcorreu, em fevereiro passado, o primeiro aniversário da Lei de Concessões, sem que se desse ao fato maior importância, não fosse o recente livro do professor Arnoldo Wald e de seus colegas de escritório referente ao direito de parceria, com prefácio do presidente da República, que oferta, ao diploma legal, toda sua relevância, destacando os resultados positivos, que ensejam verdadeira modificação da sociedade.
Efetivamente, tanto quanto o combate à inflação, e até em complemento ao mesmo, a introdução da concessão moderna no direito brasileiro tornou-se grande catalisador do desenvolvimento de nosso país, em clima de estabilidade dominado pela moralidade pública e empresarial.
De fato, sob o prisma econômico, o Brasil está ainda sofrendo de um déficit infra-estrutural quase tão pernicioso quanto o déficit público, pelo fato de gerar gargalos de estrangulamento, que dificultam o bom funcionamento das comunicações, dos transportes e o aumento da produção e a adequada circulação de bens em geral.
Diante da falta de recursos dos poderes públicos e da consequente impossibilidade de realização dos investimentos necessários para assegurar a manutenção e o aprimoramento da qualidade dos serviços públicos, as soluções adotadas só poderiam ser, respectivamente, a privatização e a instituição de um sistema de concessões.
Na realidade, a privatização se destina a resolver o problema presente das sociedades de economia mista e das empresas públicas, muitas das quais estão à beira da insolvência, enquanto a concessão permite a construção do futuro, substituindo a administração pelo segmento privado, não só na manutenção dos serviços públicos mas também (e este é, no momento, o seu aspecto principal) no tocante à realização de obras públicas.
Estas passam a ser construídas pela iniciativa privada, com seus recursos e suas técnicas de "management", suas modernas tecnologias e seu cuidado para evitar desperdício, tudo sob a fiscalização contínua de autoridades e usuários.
Além de transferir o ônus da construção das obras para as empresas privadas, o governo pode exigir a constante modernização e atualização das técnicas e dos equipamentos, correndo as despesas e riscos por conta da concessionária, que recebe os pagamentos de seus usuários.
Além de permitir o uso de poupanças privadas e dos melhores métodos de gestão, a concessão permite a redução de custos nas obras públicas, pois o concessionário tem interesse em gastar o mínimo, enquanto, no passado, os empreiteiros pretendiam ganhar o máximo possível, o que era lícito dentro do sistema então vigente.
Acresce que desaparece a intervenção maligna do poder político nas obras, pois os empreiteiros nada mais terão a receber, como pagamento, dos poderes públicos.
Há, assim, com a redução substancial da inflação e a substituição das empreitadas do passado pela concessão, verdadeira revolução moral, pois alguns dos importantes fatores de corrupção deixam de existir.
É também importante assinalar como, ao contrário de outros diplomas legislativos, a Lei de Concessões "pegou" e propiciou, em um único ano, repercussões de dimensões até inesperadas, tanto no plano federal como no estadual e municipal.
Na realidade, a lei, que decorreu de projeto do então senador Fernando Henrique Cardoso, levou muito tempo para ser discutida e aprovada. Agora, parece que se recuperou o tempo perdido, com a implantação do sistema em áreas tão distintas quanto a da eletricidade, do gás, das rodovias, das ferrovias, das comunicações e dos portos, para só citar alguns exemplos.
Ao lado da União Federal, vários Estados, em particular os de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Rio Grande do Sul, e, já agora, alguns municípios, estão recorrendo, com excelentes resultados, à concessão, como salienta o trabalho do professor Arnoldo Wald.
Finalmente, cria-se na concessão, nas relações entre o Estado e o particular, uma nova concepção da parceria, com a união dos esforços de ambos para um fim comum de interesse social, quando, no passado, a autoridade usava seu poder de comando sem que houvesse, em muitos casos, o diálogo necessário com a sociedade.
Para os juristas, trata-se de revigoramento de contrato dentro do Estado de Direito, como salientado pelo presidente da República no prefácio do livro.
Por essa razão, não poderia deixar de parabenizar a editora "Revista dos Tribunais" e o autor, por trazerem a publicação de obra de tal magnitude e importância que certamente auxiliará a todos os estudiosos do direito na compreensão desta nova realidade no direito administrativo pátrio.

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