São Paulo, domingo, 7 de abril de 1996
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A impotência tem cura

GILBERTO DIMENSTEIN

A polícia de Nova York divulgou na semana passada dados mostrando a evolução do crime na cidade no último trimestre. Provoca inveja (aliás, muitíssima inveja) em qualquer brasileiro, que se sente impotente diante do crime: o roubo de carros, por exemplo, caiu 42% em três anos.
Se essa redução fosse aplicada à Grande São Paulo, em março passado menos seis carros seriam roubados a cada hora, o que daria 131 por dia, 3.932 por mês e 47 mil por ano.
As estatísticas são tão expressivas que levam a uma constatação aparentemente maluca -ao estimular involuntariamente o consumo de carros novos e usados, os assaltantes ajudam a indústria automobilística brasileira e, de quebra, a manutenção do emprego. Não exagero.
Apenas na Grande São Paulo, segundo estimativas divulgadas na quinta-feira passada, desapareceram 10 mil carros em março. O acumulado de 12 meses chegaria, portanto, aos 120 mil.
Se contarmos todo o Estado e mais o resto do Brasil, esse número poderia ser multiplicado, na pior das hipóteses, por três, atingindo 260 mil.
Compare: a venda de veículos produzidos no Brasil exibiu recorde em março: foram 105 mil unidades.
Conclusão de tirar o sono: a delinquência chegou a tal ponto que roubam o equivalente a pelo menos dois meses e meio de produção de toda a indústria automobilística brasileira.
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Para perder ainda mais o sono e ficar com mais inveja ainda: computados os dados do último trimestre, os homicídios em Nova York despencaram 49% desde 1993.
Em março, a taxa de assassinatos na Grande São Paulo bateu mais um fúnebre recorde: 719 vítimas. Aplicada a taxa de Nova York, teriam sido poupadas 358 vidas, 11 por dia.
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Um dos arquitetos da maior segurança em Nova York é o ex-secretário de Segurança William Bratton; antes de ser secretário ele cuidava da segurança no trânsito. Em sua gestão os crimes no metrô despencaram perto de 80%.
Na sexta-feira, ele expôs sua estratégia num artigo publicado no "The New York Times". Suas sugestões são valiosas para qualquer polícia. O jornal pode ser lido por quem tem acesso à Internet.
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Mais uma dica, desta vez para os educadores. Melhorar a polícia é importante, mas apenas um dos ingredientes. Está bem desenvolvida em Nova York uma experiência chamada "peacemakers" (pacificadores). São adolescentes pagos e treinados para intermediar conflitos entre alunos das escolas da rede pública, evitando a violência. É, em essência, um processo de reeducação.
Os resultados que vi são simplesmente extraordinários.
Governadores e prefeitos deveriam enviar professores para cá, a fim de estudar esse projeto.
PS - Sugiro uma experiência em especial realizada numa escola pública do Harlem, bairro marcado pela violência das gangues. Eles estão abertos a receber visitantes, e o contato é Joseph Stewart, pelo telefone (001-212) 234-4500 ou pelo fax (001-212) 234-4694. O endereço é 242, West 114th Street.
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Este projeto tem especial importância para os brasileiros porque, segundo dados da polícia paulista, 30% dos homicídios são provocados por motivos fúteis.
Começa com discussão por causa de futebol, mulher etc, e acaba em tiro.
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Bobagem ficar esperando apenas pelo crescimento econômico para melhorar os índices de criminalidade.
No mesmo mês em que São Paulo teve violência recorde, soubemos que a inflação foi a mais baixa dos últimos 40 anos (0,23%); o comércio vendeu mais do que no mesmo período do ano passado (que tinha bons indicadores); a produção de veículos foi recorde; o valor médio do salário cresceu (embora ainda seja muito baixo). Mesmo assim, os roubos aumentaram.
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Não se pode culpar o desemprego. Embora crescente, a taxa permanece em torno dos 5%, mesmo patamar dos EUA, baixo para os padrões internacionais.
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A melhor notícia da semana foi a previsão da Fipe de que a inflação pode ficar abaixo de 10% este ano, o que significa aumento de renda para os mais pobres. É um extraordinário sinal de que a democracia é eficaz para promover crescimento e distribuir renda.
Mas, ao mesmo tempo, cresce a desconfiança no exterior de que o presidente Fernando Henrique Cardoso esteja montado numa bomba-relógio, de que seja incapaz de segurar os gastos públicos.
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Para aliviar as notícias sombrias da coluna de hoje, trago boas novidades científicas.
Publicado na prestigiosa "The New England Journal of Medicine", estudo recente mostra que um remédio chamado Caverject é eficiente contra a impotência sexual.
O remédio foi aplicado em 683 homens, em 50 Estados americanos.
Já foi aprovado pelo rigoroso Food and Drug Administration, do governo dos EUA, e custa US$ 15 cada dose.
Não importa, segundo o estudo, se a impotência está ligada a problemas físicos ou psicológicos.
De cada 100 que testaram, 94 ficaram satisfeitos.

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