São Paulo, quarta-feira, 10 de abril de 1996
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BC sabia do Econômico, diz auditor

FREDERICO VASCONCELOS
EDITOR DO PAINEL S/A

A Ernst & Young participou de negociações com o Banco Central e a administração do Econômico, muito antes da intervenção, para tentar evitar a quebra do banco.
"Ninguém pode dizer que não sabia das coisas", diz o presidente da auditoria, George Roth, 55, em entrevista exclusiva à Folha.
A principal restrição à Ernst & Young é a falta de ressalvas explícitas nos balanços, alertando os investidores -já naquela ocasião- para o descalabro do banco.
*
Folha -O auditor do Econômico foi punido pelo Conselho Regional de Contabilidade. Ou seja, julgado pelos próprios pares. O sr. acha que ele foi um bode expiatório?
George Roth - O nosso sócio que assinou o parecer do Econômico foi julgado, entre aspas, culpado. Vamos recorrer ao Conselho Federal de Contabilidade. Nós achamos que o julgamento foi, em grande parte, de cunho político. Se preciso, vamos recorrer na Justiça.
Folha - A Ernst & Young questionou, alguma vez, a qualidade e a concentração dos créditos do Econômico? Fez alguma ressalva?
Roth - Eu vou ter que responder essa pergunta indiretamente. Todo o processo de auditagem do Econômico foi feito a três mãos, envolvendo os administradores e o próprio BC. Houve problemas com a a renegociação de créditos, níveis de provisionamento etc.
Folha -Isso foi muito antes da intervenção?
Roth - Claro. O envolvimento do BC é de longa data. Houve uma série de negociações que implicaram uma exigência do BC para um aporte de capital. Havia negociação com parceiros em potencial. Isso é um fator que eu chamaria de compensatório.
Ao mesmo tempo, havia apoio financeiro dos bancos oficiais. Isso tudo deu para os envolvidos, inclusive os auditores, algum nível de conforto.
Folha - Essa negociação estava retratada no parecer? O auditor tinha obrigação de fazer menção?
Roth - Obrigação, não. Houve algumas críticas de maquiagem do balanço. No balanço, foi demonstrado que o passivo circulante estava superior em R$ 1,8 bilhão ao ativo circulante. Isso é indicador de um descasamento entre captações a curto prazo e aplicações de longo prazo. E é indicador de uma alavancagem alta. Alguém olhando o balanço -tenha a santa paciência- tinha que ver que o balanço estava desequilibrado, mas a situação estava sendo ajustada.
Folha - Na ocasião, não seria necessário um alerta do auditor?
Roth - Ainda não.
Folha - O patrimônio respondia apenas por um quinto do endividamento. O auditor fez ressalva sobre o risco para a continuidade do banco? Cabia essa ressalva?
Roth - Ainda não cabia. Havia esse apoio compensatório, as negociações para aporte de capital, o apoio financeiro. O que gerou a quebra foi a corrida. Não se pode dizer que houve um problema de continuidade em 30 de junho.
Folha - A Ernst & Young alguma vez acionou a CVM (Comissão de Valores Mobiliários) e o BC?
Roth - A própria CVM estava acompanhando, e não há dúvidas de que a CVM e o BC se comunicam. Talvez o BC tenha maior responsabilidade... Ninguém pode dizer que não sabia das coisas...
Folha - O desequilíbrio seria facilmente constatado por quem faz análise de balanços. Mas o papel do auditor não vai um pouco além, alertando o investidor?
Roth - Naquele momento, tudo que nós achamos que devia ser divulgado foi divulgado. E há mais: foi divulgado (no balanço) que o setor financeiro estava dando prejuízo e que o lucro estava sendo puxado das entidades fora do país ou das entidades não-financeiras.
Folha - Isso estava ressalvado no parecer do auditor?
Roth - Não. É divulgação nas notas explicativas.
Folha - A menção nas notas explicativas foi exigência do auditor?
Roth - Em tese, as anotações são da administração, e o parecer é do auditor. Mas nós sabemos que isso funciona em parceria.

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