São Paulo, sexta-feira, 12 de abril de 1996
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DE DELITOS E PENAS

DE DELITOS E PENAS

A situação carcerária brasileira -e de alguma forma também a mundial- chegou a um limite, muito bem delineado pela sucessão de rebeliões espalhadas por todo o mundo.
Superlotação, condições indignas de existência, baixíssimas incidências de recuperação do infrator são apenas alguns dos pontos que já colocam em xeque o atual sistema jurídico baseado em penas de prisão.
Assim, a idéia do governo de indultar 18 mil presos (cerca de 13% da população carcerária) que não representam ameaça física para a sociedade é um paliativo muito bem-vindo. Ainda assim, um paliativo.
O problema, que diz respeito ao mundo inteiro, é que a maioria das legislações ainda trabalha com paradigmas do século 19, que já não dão mais conta de um mundo que se prepara para entrar no terceiro milênio.
Até o século 18, praticamente inexistia o problema carcerário. A cela era o local onde o prisioneiro era depositado até que fosse julgado e, no mais das vezes, executado. A partir do 18, com as idéias humanistas de Cesare Beccaria, o crime passou a ser encarado como um ato deliberado visando a alguma vantagem que deveria ser refreado com uma punição proporcional ao delito. Penas exageradas, como a capital, eram não só desnecessárias como inúteis.
A partir da revolução francesa, esse conceito sofreu uma modificação, e a pena estabelecida para o criminoso passou a ser individualizada, com a instituição de circunstâncias agravantes e atenuantes e a inimputabilidade de crianças e loucos.
É preciso agora avançar ainda mais na individualização da pena, ampliando o leque de sanções possíveis -serviços comunitários, multas, suspensão de direitos- e evitando a privação da liberdade, reservando-a aos casos realmente irremediáveis.
Num Brasil que infelizmente ainda confunde justiça com vingança, essa necessária revolução jurídica é temerária, porque pode caminhar no sentido exatamente oposto, como lembrou recentemente o ministro Sepúlveda Pertence, presidente do STF.
O fato é que boa parte do mundo civilizado começa a rever sua legislação para torná-la adequada ao futuro. Aqui, há quem apregoe a volta a um passado pré-Beccaria.

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