São Paulo, sábado, 20 de abril de 1996
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Regeneração frustrada

LÚCIA MARIA CASALI DE OLIVEIRA

A concessão indiscriminada de benefícios não foi, não é e não será nunca solução para a crise penitenciária.
Aqueles que divergem dessa afirmativa, visando acobertar a omissão do Estado em não enfrentar as questões do aumento da criminalidade e do descumprimento da lei, querem ignorar a filosofia que embasou a edição da Lei de Execução Penal.
Proteção dos bens jurídicos e ressocialização do condenado são os sustentáculos da própria lei e devem ser considerados sempre juntos na busca de soluções. Qualquer descompasso entre essas premissas causa prejuízo à sociedade, pelo risco a que fica exposta, e ao próprio condenado, ao ver frustrada a expectativa de regeneração.
Sob a alegação de se obter vagas, mais uma vez se descumpre a lei, desprezando-se o sistema progressivo de cumprimento de penas, a realização de perícias para avaliação da periculosidade do condenado e outros institutos legais. Assim devolve-se à sociedade condenados -independentemente do estágio de recuperação- aos quais não foi nem sequer ensinado um ofício e que terão que enfrentar um país onde há crescente desemprego.
Como consequência, a maioria daqueles que, em razão do decreto, forem jogados nas ruas retornará ao cárcere, onde permanecerá em companhia dos que vierem a ser presos, já que a polícia não deixará de cumprir mandados de prisão ou efetuar prisões em flagrante.
Ademais, o decreto consolida a certeza da impunidade: não importa a conduta delituosa, haverá sempre esse paliativo, já que, sendo conveniente e necessário, o Estado assim enfrentará a questão da superpopulação carcerária.
Por ser essa medida fruto do desejo dos responsáveis diretos pelo gerenciamento do sistema penitenciário do país, não representa a vontade da maioria da sociedade brasileira e tampouco de seus legítimos representantes no Congresso Nacional -nunca ouvidos sobre o tema.
Na verdade falta ao Estado vontade política para viabilizar a infra-estrutura necessária à aplicação da Lei de Execução Penal -função precípua do Estado. Cumprindo esse seu papel, a lei seria obedecida integralmente, o que se traduziria numa solução responsável para a questão penitenciária.
Penso, assim como os demais integrantes da Promotoria de Justiça das Execuções Criminais da Capital, que, no mais, qualquer outro caminho é pura mistificação!

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