São Paulo, sábado, 20 de abril de 1996
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Tocando no ponto nevrálgico

PAULO RICARDO TONET CAMARGO

O indulto recentemente assinado pelo presidente da República é oportuno e necessário. Nossas prisões estão superlotadas, impedindo que os condenados cumpram com dignidade a pena restritiva a que foram submetidos.
Assim, em vez de saírem ressocializados do cárcere, adquirem vícios contraídos por causa de uma promiscuidade jamais querida pelo legislador ou pela sociedade. Por isso o efeito do encarceramento geralmente contradiz o propósito emendador da pena: a pessoa sai muitas vezes mais criminosa do que o era ao entrar no presídio.
O indulto procura atenuar esse desvio, atingindo delinquentes primários de bom comportamento e que não tenham cometido crimes hediondos ou participado de rebeliões. A pena dos indultandos deve ser inferior a seis anos.
Tudo, então, mostra que as pessoas beneficiadas não constituem um sério perigo à convivência social, pois, ocasionalmente, praticaram um crime, circunstância a que todos nós podemos um dia estar sujeitos.
O indulto, de outro lado, toca em ponto nevrálgico, representado pelas delegacias de polícia e cadeias públicas, onde se amontoam presos condenados em condições precárias de permanência, às vezes dormindo por turnos ou amarrados nas grades das celas.
A medida presidencial, se não resolve de vez o problema, ao menos alivia a dramática situação, diminuindo o número de presos aí retidos e possibilitando que os delegados de polícia voltem à sua função de investigação.
Importante afirmar que a despressurização desse estado caótico das casas prisionais são a consequência, mas não o móvel do governo federal para a concessão do indulto. Este foi fundamentalmente a necessidade de se alcançar aos presos direitos que lhes são assegurados pela Lei de Execução Penal e não implementados pela falência do sistema, que nem sequer permite a progressão de regime trazida pela lei de 1984.
Mister afirmar que a própria lei mencionada estabelece que, com um sexto da pena cumprida, o preso tem direito ao trabalho externo e, portanto, é colocado no convívio da sociedade. Nenhuma novidade, pois, no decreto que a lei há quase 12 anos já não estabelecesse.
Finalmente é oportuno dizer que o indulto não é uma providência solitária, mas está ligado a um rol de medidas de uma nova política penitenciária, dentre as quais surgem as reformas do Código Penal, visando priorizar as sanções que não levem o réu à segregação, mas a prestar serviços à comunidade.
A prisão deve ser reservada àqueles que oferecem efetivo perigo à sociedade, pois o custo de sua manutenção hoje monta a cerca de R$ 70 milhões por mês, do dinheiro do contribuinte.
Com o sistema da maneira em que se encontra, não tratando da raiz do problema criminológico da delinquência, mas tratando a pena como mera vingança social, traduz esses gastos em mais insegurança. Ou campeamos um novo pensar sobre a pena no Brasil ou o contribuinte continuará a investir na sua própria insegurança.

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