São Paulo, terça-feira, 23 de abril de 1996
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Maior parte saiu de outros Estados

DO ENVIADO ESPECIAL A CURIONÓPOLIS

Os sem-terra do Pará são na verdade sem-terra de todo o Brasil. A Folha ouviu quatro relatos de sobreviventes do massacre de Eldorado de Carajás que deixaram seus Estados para tentar a sorte no sul sul e leste do Pará.
Cláudia Regina Rodrigues, 26, nasceu no Maranhão.
"Saí de São Luis em 1982. Meu pai e minha mãe trabalhavam em um restaurante, mas a situação lá estava muito precária para cuidar de cinco filhos. Viemos para o Pará porque a gente tem que cair em um lugar que dê ao menos para a gente viver", conta.
"Ficamos perambulando por aí, até que seis meses atrás fui para a fazenda Macaxeiras (em Curionópolis), com meus marido e sete filhos."
Sobre o confronto com a polícia, ela diz: "Deus é bom porque, pelo tanto de tiro que eles deram, até que escapou muita gente".
"Quando eu tinha 13 anos, saí do Ceará para morar na casa de um tio, que estava em Marabá", conta João Arruda Faria, 45.
"Eu só tinha trabalhado na roça, porque eu não tenho leitura e tenho que pegar no pesado. No dia 8 de janeiro de 1966, vim para Eldorado de Carajás. Eu não tinha nada, vivia jogado." Ele não lembra quando entrou no MST.
"Na hora da batalha, a gente foi cercado. Eles atiravam dos dois lados e a gente começou a correr para o mato para escapar. Os que não correram foram tombando. Eu pensei que não ia conseguir a minha vida, mas Deus é grande e eu consegui", afirma.
"Tem três anos que estou em Eldorado de Carajás", relata João Pereira de Souza, 25, natural de Goiás.
Guerra
"O que aconteceu aqui parecia uma guerra. Ninguém esperava que eles atirassem de verdade. Por pouco, quase que a gente se lascava. Mas muitos não tiveram a mesma sorte e acabaram morrendo cheios de bala. É muito triste ver morrer um companheiro que estava com você agorinha. Não desejo isso para ninguém."
Luis Gonzaga Rocha de Souza, 32, do Piauí, diz que viu "uma guerra" em Eldorado de Carajás. "O que eu assisti aqui parecia uma guerra. Vi os soldados lutando que parecia uma guerra com outro país."
"Uma bala passou raspando na minha cabeça. Olhe o rasgão que deu. Se eu fosse um pouquinho mais alto, tinha morrido. E mesmo assim, eles dizem que atiraram só na perna da gente. Até agora está doendo. Mas, tem nada não. Ainda estou vivo, graças a Deus."

Texto Anterior: Suspeito nega ter matado Oziel
Próximo Texto: Polícia divulga lista oficial dos mortos
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.