São Paulo, quinta-feira, 2 de maio de 1996
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Essência feminina é tema de polêmica

FERNANDO DE BARROS E SILVA
ESPECIAL PARA A FOLHA

A maior arma da mulher diante do homem ainda é a capacidade de seduzi-lo sexualmente, de fazê-lo refém do desejo que ela provoca. Esse poder, no entanto, é ao mesmo tempo um instrumento que a subjuga e eterniza uma relação que ao longo dos séculos sempre foi assimétrica, marcada pela dominação de um sexo sobre o outro.
Esse foi um dos pontos que a psicanalista e deputada federal, Marta Suplicy (PT-SP), abordou anteontem na série "Diálogos Impertinenetes", debatendo "O Feminino" com o filósofo e professor titular do Departamento de Filosofia da USP, Renato Janine Ribeiro.
O evento, promovido pela Folha, PUC-SP e Sesc, contou com a mediação do jornalista Caio Túlio Costa, diretor-executivo da Folha Online, e do professor do Departamento de Teologia da PUC-SP, Mário Sérgio Cortella.
Diante da colocação de Marta, Janine concordou que há mesmo uma aporia entre a capacidade de sedução da mulher e a submissão que essa mesma capacidade traz consigo. Acrescentou ainda que o poder do feminino pode ser detectado na vida doméstica, o que, segundo ele, "mostra que ela também é altamente politizada".
Se ambos concordaram nesse ponto, houve vários momentos em que ocorreu o oposto. O principal deles, quando o debate enveredou para a questão da existência de uma "essência feminina".
Marta Suplicy insistiu numa "diferença" irredutível do feminino. "Somos diferentes, pensamos diferente, a nossa lógica é a do afeto, da compreensão, enquanto a dos homens é a da dominação, da manutenção da autoridade."
Rejeitando o argumento, Janine afirmou que "definir qualquer essência do feminino é equivocado". "Tudo é operacional, tudo funciona dentro de certas culturas e contextos históricos, não sei porque devemos considerar natural que um corpo deve ter tais ou quais determinações pelo simples fato de que alguns comportamentos foram valorizados e outros descartados em nossa cultura."
Marta apartou e disse ter-se "sentido desqualificada" ao ouvir o parceiro de debate afirmar que não existe essência feminina nenhuma. "Eu gostaria de poder ter essência", reivindicou a deputada.
Janine retrucou dizendo que pensar em termos de essências é algo estático, que desconsidera contextos culturais e a história. Completou afirmando que hoje, "quando os papéis decisivos para definir a mulher estão dançando", há uma grande oportunidade histórica de se caminhar para uma "relação mais solidária e integrada entre homem e mulher".
Em vários momentos Marta usou o debate para referir-se ao mal-estar de trabalhar no Congresso Nacional, um ambiente, segundo ela, profundamente machista. Disse que os partidos, sem exceção, "desqualificam as mulheres, as mais combativas não são levadas a sério, o poder da mulher na Câmara é muito cosmético".
A deputada ainda defendeu o sistema de cotas, que garante às mulheres uma participação mínima nas listas partidárias aos candidatos a cargos legislativos. O sistema foi visto com simpatia por Janine. Ele ressalvou, no entanto, que essa prática nos EUA está ligada a interesses de grupos.
No final do encontro, Marta Suplicy fez um protesto à organização do evento. Disse que o fato de ter debatido "o feminino" ao lado de três homens "às vezes pesou um pouco, ficou meio ruim".

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