São Paulo, quarta-feira, 8 de maio de 1996
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Ataque de verborragia

CARLOS HEITOR CONY

Rio de Janeiro - Ele falou em nhenhenhém e revelou-se mestre no ofício. Anteontem, durante uma hora e vinte minutos, declarou que não é camelô -e age exatamente como camelô. Quando se esperam do governo ações e não omissões, ele convoca ministros, autoridades e imprensa para ato explícito de verborragia que nunca tivemos igual no passado.
Nos flashes da TV vimos ministros, autoridades e convidados constrangidos, ouvindo as banalidades que seriam naturais numa aula de segundo grau, quase todos com cara de que perdiam tempo com os desabafos presidenciais.
O presidente precisa compreender de uma vez por todas que a verborragia dele é ridícula e estéril. Ele é governo, e não oposição. É mandatário da nação, quis ser presidente e é presidente não-contestado. Logo, cabe a ele a ação de governo e não o discurso, a crítica, o destempero verbal.
Ele recebe todos os meses o salário e mordomias que pagamos para que ele trabalhe e não para que insista em dar a eterna e inútil aula de como se deve governar o país. Essa função qualquer um pode fazer, até melhor do que ele e sem nada custar aos cofres públicos.
Destaco uma jóia presidencial: "Temos que enfrentar na questão social as causas efetivas e não simplesmente fazermos brilharecos". A banalidade da frase comprometeria um professor de primeiro grau, um candidato a vereador no Alto Xingu. Política à parte, pensando apenas em termos intelectuais, acho que a carreira acadêmica do presidente é um equívoco. Deixa mal seus mestres, alunos e admiradores.
O nhenhenhém voltou-se contra ele. O camelô também. Pior é que agora ele fala em neoburrismo -acho que devia ser "neoburrice", mas o problema é dele.
Inventar palavras é salutar em poesia, gostoso em romance. Em administração é vulgar tapeação.

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