São Paulo, domingo, 12 de maio de 1996
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Mais e mais dólares

CELSO PINTO

Voltou a entrar uma enxurrada de dólares no mercado. Em apenas seis dias úteis de maio, entrou US$ 1,8 bilhão líquido, mais do que todo o mês passado (US$ 1,5 bilhão) e o dobro de março (US$ 824 milhões).
Depois de ter sofrido uma forte retração em março, a média por dia útil das entradas financeiras em abril atingiu US$ 244 milhões, mais do que a média do primeiro bimestre (US$ 240 milhões), que levou o BC a criar restrições ao ingresso de dólares. A média por dia útil de maio até agora é de US$ 327 milhões, a maior do ano.
Os números são impressionantes, mas não preocupam o diretor da Área Internacional do BC, Gustavo Franco. "Houve uma melhora, mas não parece ser permanente", disse Franco a esta coluna.
De fato, tanto em abril quanto em maio, alguns fatores extraordinários ajudaram a engordar as entradas pelo câmbio financeiro. O Banco do Brasil, em abril, trouxe US$ 300 milhões de capital de suas subsidiárias para reforçar o caixa interno.
Essa operação do BB já havia sido anunciada e deverá envolver mais US$ 500 milhões. O BB concluiu, também, a troca de títulos da dívida (US$ 1,4 bilhão em Mydfas) por títulos do Tesouro (NTN cambiais), mas essa operação, diz Franco, é neutra do ponto de vista cambial.
Outro fator extraordinário foi a entrada dos bônus da Cesp no exterior, de US$ 710 milhões, que ajudaram a fazer com que o saldo do câmbio financeiro, quarta-feira, chegasse ao recorde de US$ 832 milhões. Também é verdade, contudo, que no mês passado houve uma saída extraordinária de US$ 1,2 bilhão para pagamento de dívida externa federal.
O fato é que a tendência de entrada de dólares tornou-se ascendente, desde a queda em março, provocada, basicamente, pelas oscilações das taxas de juros americanas. É o que Franco chama de "tendência à maldição chilena".
É a situação em que o ingresso de dólares cresce, animado pela confiança na economia e a despeito da redução dos juros. A queda dos juros afasta investidores em renda fixa, mas atrai investidores em bolsa.
Há indicações que os investimentos em bolsa estão crescendo mas, pelo que indica o mercado, a maldição chilena ainda não chegou. Uma boa parte do dinheiro que entra ainda é motivada pelo enorme diferencial entre os juros externos (mais baixos) e internos.
A captação via bônus cresceu 29% no primeiro trimestre sobre o trimestre anterior. Os bancos, que sempre lideraram essas captações, responderam por apenas 44% do total no primeiro trimestre. O mercado ficou desconfiado com o agravamento da crise bancária no Brasil, mas a situação tem melhorado.
A principal motivação para buscar dólares continua sendo a diferença de juros, explica um banqueiro. Considerando custo de captação, taxas e comissões, um banco capta a uns 15% no exterior (além da variação cambial). Aplica, aqui, a 17% ou 18% numa empresa de primeira linha, ou até 25% numa empresa de menor porte.
O BC colocou prazos mínimos, impostos e taxas. Mas sempre há uma maneira de contornar.
Se um banco ou uma empresa lançar papéis externos por prazo inferior a cinco anos, tem que pagar 7% de Imposto sobre Operações Financeiras. Se o prazo for inferior a oito anos, paga também 15% de Imposto de Renda.
O que bancos e empresas têm feito é emitir seus papéis por intermédio de uma subsidiária (normalmente num paraíso fiscal), por três anos, um prazo mais palatável para o mercado. Como é no exterior, não se paga impostos.
Para trazer o dinheiro para o Brasil, o banco ou empresa aqui faz uma emissão privada por oito anos, que é comprada por sua subsidiária no exterior. Alguns emitem o papel a oito anos, com possibilidade de resgate ("put") em três anos.
Se ficar difícil a subsidiária rolar a emissão ao final de três anos, resgata-se o papel emitido daqui para a subsidiária e paga-se os impostos (após três anos). Se tudo der certo, a subsidiária externa rola o bônus ao final de três anos e estica a emissão até oito anos. Nada se paga em impostos.
Franco diz que "tem um custo extra para montar a malandragem" e que, de todo modo, é uma brecha que não o preocupa.

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