São Paulo, terça-feira, 14 de maio de 1996
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Números da mortalidade infantil são irreais

ELZA PIRES DE CAMPOS
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Os números da mortalidade infantil no Brasil são irreais. A estimativa do 40 crianças mortas até um ano de idade por 1.000 nascidas vivas -que o governo pretende reduzir à metade até 1998- esconde um quadro ainda mais dramático. Em vários municípios, crianças nascem e morrem longe das notificações dos cartórios.
São os chamados "anjinhos", que povoam cemitérios clandestinos. O trabalho de um ano do PRMI (Projeto para Redução da Mortalidade na Infância), do Ministério da Saúde, revela comunidades onde, nos últimos oito anos, não havia nenhuma notificação de nascimentos. Nem de mortes.
É o caso do município de Cacimbinhas, em Alagoas. Até o ano passado morriam 240 crianças por 1.000 nascidas vivas na cidade."Nós fomos ao cartório, à prefeitura e não encontramos registro de nascimento de crianças", diz a médica Ivone Torres de Azevedo, coordenadora estadual do PRMI no Estado.
Ivone explica que as famílias não podem pagar R$ 17,00 por uma certidão. Por isso, as crianças ficam excluídas de um direito à cidadania: o registro civil.
Para saber o número de óbitos nos 15 municípios de risco de Alagoas, a equipe de Ivone entrevistou o coveiro da cidade.
Cemitérios clandestinos
Em Goiás, o diagnóstico da mortalidade começou com um trabalho de listagem de cemitérios clandestinos. No município de Guarani de Goiás, os agentes de saúde encontraram sete cemitérios clandestinos. A médica Irani Ribeiro de Moura, do PRMI em Goiás, informa que nos 15 municípios em situação de risco os dados eram subnotificados.
"Nosso principal problema são os registros de nascimento e morte", informa o ministro da Saúde, Adib Jatene. Ele diz que só o trabalho dos agentes comunitários de saúde, que percorrem uma média de 150 famílias por mês, pode resgatar informações confiáveis.
"Esse é o problema que mais interfere no acompanhamento das crianças nos municípios de maior risco", afirma a coordenadora do PRMI, Maria Lúcia Carnelosso, referindo-se às notificações de nascimento e morte das crianças.
As ações do PRMI foram levadas no ano passado a 360 municípios. A meta para este ano é de 915 municípios, incluindo aqueles onde haverá ações de saneamento básico.
O programa de combate à mortalidade infantil concentra suas ações em cinco áreas: saúde e nutrição, saneamento, melhoria da vacinação, ampliação do programa de agentes comunitários e acompanhamento do pré-natal.
Agentes
Os agentes visitam cada família, pesam as crianças, verificam se estão recebendo suplementação alimentar -no caso, o programa do leite- e passam a acompanhar toda criança que nasce com menos de 2,5 kg, consideradas em situação de risco.
A avaliação preliminar de um ano de maior atenção aos municípios considerados de risco revela que houve queda de pelo menos 30% na mortalidade infantil em todos os locais onde foi implantado o programa.
No Nordeste, as taxas de mortalidade caíram em pelo menos quatro Estados: Alagoas, Ceará, Piauí e Maranhão.

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