São Paulo, quarta-feira, 15 de maio de 1996
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Um vendaval chamado globalização

ANTONIO DO VALLE

Após a queda do muro de Berlim, o sistema econômico-financeiro mundial entrou numa fase de intensificação das tendências da globalização.
Como frisou o professor Gilberto Dupas, consultor econômico do Instituto de Estudos Avançados da USP, as corporações transnacionais, neste fim de século, estão se tornando "estrutura dominante na oferta de bens e serviços".
"E os altos investimentos para o comando tecnológico de produtos e processos continuarão tendendo a uma concentração que habilitará apenas um conjunto restrito de algumas centenas de empresas gigantes a competir ferozmente por preço e qualidade de produto", enquanto outras se ocuparão das redes de distribuição.
As multinacionais decidem atualmente como, quando, quanto e onde produzir. Influenciam de forma determinante a política dos países, de tal forma que no recente Fórum Econômico Mundial, em Davos, foi previsto um acirramento na disputa pela conquista dos mercados emergentes (vide o episódio da Renault no Brasil).
O peso na economia mundial dessas empresas multinacionais é enorme. Segundo estudos da Unctad, em 1992 o total de suas vendas somou US$ 4,8 trilhões (o dobro de 1982), crescimento muito superior à média do crescimento econômico mundial no período.
No entanto, foi verificado que os investimentos diretos que elas faziam geravam cada vez menos emprego, provocando "desemprego estrutural" nos países desenvolvidos e em desenvolvimento.
Isso porque a constante evolução das tecnologias, objetivando maiores lucros e produtividade, liquida milhares de empregos, e a especulação financeira, viajando velozmente pelo espaço, fecha fábricas e funde empresas, além de dissolver as fronteiras dos Estados nacionais.
Assim, a tendência intervencionista das altas finanças internacionais inviabiliza qualquer projeto nacional de países do Terceiro Mundo que contrarie seus interesses e conveniências, por mais adequado e convincente que esse projeto seja do ponto de vista interno.
Nos anos 90, o livre comércio global tornou-se um princípio sagrado no campo da economia. Até no referido fórum, em Davos, foi concluído que o mundo só tem a ganhar com a globalização e com a entrada na competição internacional dos países recém-industrializados e dos novos mercados.
Contudo os custos estão sendo tão elevados em termos de desigualdade e marginalização social que Rubens Ricupero dizia, há pouco tempo, que "as previsões otimistas sobre a globalização foram humilhadas pelos fatos", e Alain Touraine caracterizaria o processo como novo imperialismo, enfatizando que o importante hoje "é sair dessa transição liberal e não ingressar nela".
No Brasil, a reestruturação da economia, pela necessidade de competir para sobreviver no mercado globalizado, teve efeitos devastadores em termos de falências e altas taxas de desemprego, multiplicando o número já enorme de marginalizados e miseráveis.
A solução encontrada pelas empresas foi aumentar a produtividade, melhorando as tecnologias e cortando empregos.
Dentre os mais sacrificados com a abertura estão os micro, pequenos e médios negócios, que tiveram, ainda, de fazer frente à falta de crédito e aos juros escorchantes, pois o Real privilegiou as grandes empresas, dando-lhes condições de tomar crédito externo.
O resultado do emprego industrial em 1995 foi o pior dos últimos anos. O total de vagas fechadas nas indústrias paulistas nos últimos 12 meses, por exemplo, foi de 263.097, com queda do nível de oferta de 11,12%.
A crise é tão séria que começou a ser mudado o relacionamento entre capital e trabalho, e os sindicatos estão se preocupando mais com a manutenção dos empregos, mesmo renunciando a alguns direitos!...
Os países asiáticos idealizaram um modelo de desenvolvimento que lhes permite liberar o seu comércio com a devida cautela, garantindo que os mercados do mundo continuem abertos aos seus produtos, a fim de manter o crescimento acelerado sem exclusão social. A nós, brasileiros, nos faltaram, infelizmente, prudência, ponderação e sabedoria para nos defender do vendaval chamado globalização.

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