São Paulo, sexta-feira, 17 de maio de 1996
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Intelectuais

CARLOS HEITOR CONY

Rio de Janeiro - Com frequência cada vez maior, noticia-se que o presidente da República terá encontros com intelectuais aqui no Rio. É um castigo que a cidade não merece. Num desses últimos encontros, FHC debateu com Dercy Gonçalves os magnos problemas da atualidade. Curiosamente, o professor Giannotti volta e meia gosta de se intitular intelectual. Em artigo de anteontem ele inicia pomposamente um parágrafo: "Na medida em que somos intelectuais..."
Tenho ojeriza à palavra e à função. Em 1964, um grupo de amigos tentou indicar meu nome para intelectual do ano. Em crônica publicada na época, intitulada "Intelectual é a vovozinha", recusei e nem agradeci a idéia.
Em 65, com oito amigos fui preso durante uma reunião da OEA, realizada no Hotel Glória. Os jornais falavam em nove intelectuais, tirei o meu da seringa: "Fui vaiar o presidente Castelo Branco como cidadão", respondi ao coronel que me interrogou dias depois, querendo saber o que os intelectuais tinham contra o regime da época.
Outro dia, um repórter me telefonou para saber se eu havia ganho o prêmio Machado de Assis de intelectual do ano. Levei um susto dos diabos, fui conferir o ofício que recebi do presidente da Academia Brasileira de Letras. Para minha tranquilidade, o Antônio Houaiss apresenta outro motivo para me comunicar aquilo que chamam de "láurea".
Reconheço que Machado de Assis deve estar dando voltas no túmulo. Contudo, não posso negar a autoria de alguns livros e não tenho culpa de ganhar por generosidade da Academia o que não pedi. Agora, se o negócio fosse na base do intelectual, eu sugeriria que o prêmio fosse distribuído fraternalmente entre FHC, Serjão, Bresser, Dercy Gonçalves, dona Ruth, essa gente que compõe a "nomenklatura" atual e que muito me chateia. Com a óbvia exceção da Dercy Gonçalves, que muito me distrai e comove.

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