São Paulo, sábado, 18 de maio de 1996
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O professor, a Previdência, o nabo e a inflação

MANOEL EDUARDO MIRANDA NEGRISOLI

MANOEL EDUARDO
MIRANDA NEGRISOLI
Passada a primeira votação da reforma da Previdência Social, chegou-se à conclusão da causa de toda a distorção e todo o déficit da mesma: o professor universitário.
A aposentadoria do professor está para a crise na Previdência assim como o preço do nabo está para a inflação.
Os professores universitários federais, como os demais funcionários públicos, eram contratados pela Consolidação das Leis do trabalho até 1990, quando foi aprovado o Regime Jurídico Único do servidor -não por pressão do funcionalismo para dar vantagens adicionais à categoria, mas sim porque o governo federal entendeu que os encargos sociais a serem pagos pelo empregador (por ele, não pelos outros) eram altos.
Ao tornar o servidor estável, economizava-se o recolhimento ao FGTS (8%), e, ao criar o instituto de previdência próprio, cerca de 40% em encargos sociais sobre um total de R$ 40 bilhões anuais.
A interrupção do recolhimento desses encargos do maior empregador do país (R$ 16 bilhões), que representam metade do orçamento da Previdência, deixou-a arcando com as aposentadorias dos funcionários públicos até então, sem a reciprocidade do recolhimento atual. Além disso, a expectativa da mudança de regime provocou uma avalanche de aposentadorias após a transformação para o regime único.
Ao criar a aposentadoria integral para o funcionalismo (por conveniência do Estado), o governo ficou de regulamentar o Instituto de Previdência, coisa que até hoje não fez.
A contribuição de cada professor é de 12% do bruto, sendo que o Estado deveria contribuir com outros 12%, totalizando 24% sobre o salário com vistas ao pagamento das aposentadorias após 30 anos.
Essa situação é extremamente conveniente, pois assim se pode dizer que a folha de pagamento da União cresce sem aumento de salário e que o pagamento de aposentados pelo MEC representa investimento na educação.
Em um plano de previdência privada, para um indivíduo ingressando no mercado aos 20 anos e aposentando-se aos 50 anos, recolhem-se 15,3%.
Portanto, com uma contribuição de 24% durante 30 anos, é perfeitamente possível, sem privilégios, pagar uma aposentadoria integral, se a entidade responsável for gerida por gente séria e competente.
Não é o sistema que está errado. O que está errado é o roubo, a fraude, a impunidade, a gerência de pessoas escolhidas por critérios exclusivamente políticos e o uso da máquina para interesses eleitorais -que a reforma não resolve.
O professor, mais do que qualquer outra profissão, sofre o impacto da evolução da ciência, o que torna difícil manter-se atualizado por muito tempo. Há necessidade de renovação das gerações de mestres responsáveis por fazer o pensamento dos líderes nacionais.
Para cada professor titular aposentado, é possível contratar três jovens professores com todos os seus "bits cerebrais" orientados nos novos rumos da ciência, "cheios de oxigênio" e coragem para enfrentar os desafios que o futuro nos reserva. Frustrar essa geração sem trabalho, mantendo velhos mestres desmotivados, é suicídio. É destruir o futuro de qualquer nação.
O Brasil, assim como o resto do mundo, precisa abrir espaço para jovens. Os prazos de aposentadoria deveriam ser reduzidos, não para oito anos (igual ao dos parlamentares), e sim para 30 anos, para todos.
Com contribuição de 10% do empregado mais 10% do empregador, seria possível dar uma aposentadoria digna a todos os brasileiros, desde que administrada de forma politicamente correta.
A maior revolta vem do amplo noticiário nacional sobre as "concessões" em troca de votos, não por convicção ou filosofia política, mas sim por interesse pessoal ou regional.
Estima-se que a aprovação da reforma tenha custado R$ 14 bilhões, que, somados às próximas votações, se forem cumpridas, certamente colocarão em risco o Plano Real, servindo de alerta àqueles que aceitaram os favores oferecidos pelo Executivo.
Exijam adiantamento antes da segunda votação, pois o governo vendeu a mãe (do contribuinte), mas não poderá entregar.

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