São Paulo, segunda-feira, 20 de maio de 1996
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Staub critica 'bagunça' nas alíquotas de importação

ANTONIO CARLOS SEIDL
ENVIADO ESPECIAL A LOS ANGELES (EUA)

Eugênio Emílio Staub, 54, presidente da Gradiente, diz que a "bagunça das alíquotas de importação" no Brasil manterá o investimento total no setor eletroeletrônico do país "muito aquém" do que a indústria gostaria que fosse.
Ele lembra que a alíquota de importação de aparelhos de TV mudou cinco vezes nos últimos 18 meses: caiu de 35% para 20%, subiu depois para 70%, voltou a 20%, saltou para 63% e finalmente, em março, foi reduzida para 35%.
"Investimento no Brasil é complicado com essa instabilidade de regras. Ela pode inviabilizar a produção local, transformando-nos em importadores", diz.
A Gradiente, revela, ainda não definiu seu plano de investimentos para os próximos dois anos.
Staub fez essas declarações em Los Angeles, onde participou, de quarta-feira até anteontem, da E3 (Electronic Entertainment Expo), exposição da indústria de entretenimento eletrônico dos EUA, um mercado de US$ 10 bilhões.
No evento, foi apresentado o Nintendo 64, um revolucionário sistema de videogame, muito mais veloz que os anteriores e com imagens em 3-D (terceira dimensão).
A Playtronic, empresa do grupo Gradiente, por meio de sua parceria com a Nintendo da América, lançará o novo sistema no Brasil simultaneamente ao lançamento nos EUA, em 30 de setembro.
Antes da viagem a Los Angeles, Staub concedeu entrevista à Folha. A seguir, os principais trechos:
*
Folha - Como foi a Gradiente no primeiro trimestre?
Staub - A expectativa era um crescimento no faturamento de 20% neste ano, com crescimento zero no primeiro trimestre, porque o primeiro trimestre de 95 teve comportamento muito positivo.
Mas houve um crescimento de 10% no primeiro trimestre. Isso até surpreendeu. Esperávamos um primeiro trimestre difícil.
Folha - A que se atribui essa virada nas expectativas?
Staub - O nosso setor está com uma demanda firme. A realidade do nosso ramo daqui para a frente parece ser de preços estáveis, demanda firme e margens cada vez mais apertadas, tanto para a indústria quanto para o comércio.
Folha - Por que o setor cresce?
Staub - Os salários cresceram depois do Plano Real 50% em dólares. Os preços dos eletroeletrônicos caíram 20% em dólares.
Sobrou muito mais renda. Além disso, apareceu o crediário -a um juro alto, é verdade. Mas, como a renda é maior, é mais fácil pagar esse juro. Ganha dinheiro hoje quem financia o consumidor.
Folha - O que leva à redução das margens de lucros no setor?
Staub - A inflação residual. Na minha avaliação, a desvalorização do real será de 10% neste ano, uma inflação residual maior do que a inflação internacional.
Mas, na minha previsão, não vai dar para repassar para os preços. Isso comprime as margens, além do já famoso "custo Brasil".
Folha - Como o sr. avalia a questão do "custo Brasil"?
Staub - É uma realidade tenebrosa, que nos torna cada vez menos competitivos em termos internacionais. Além dos impostos em cascata, temos um terrível custo financeiro no país.
Na Coréia, o juro para um investimento industrial é de 3% ao ano, com 12 anos para pagar e cinco de carência. A inflação lá é de 5%.
Aqui, a taxa de juros cobrada pelo BNDES pode chegar a 22%. Isso só será resolvido a longo prazo, com reformas constitucionais e uma maxidesvalorização do real.
Folha - Como o sr. vê a gestão da política econômica?
Staub - Confusa. O que está claro para todos nós é que o governo não tem política econômica nem política industrial. O que há é uma divisão profunda entre teóricos.
Folha - O Real corre risco?
Staub - A estabilidade corre risco. A questão que se coloca hoje em muitos meios que frequento é quanto tempo dura o Real. O Real com suas âncoras atuais, que são os preços agrícolas e o câmbio, e a taxa de juros como freio, talvez possa sobreviver dois anos. Mas acabará não sobrevivendo tudo isso, porque os mercados percebem muito antes as fragilidades dos planos econômicos. O pior é que o governo é sempre o último a saber.

O jornalista Antonio Carlos Seidl viajou a Los Angeles a convite da Playtronic

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