São Paulo, sábado, 25 de maio de 1996
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Direito eleitoral

WALTER CENEVIVA
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

O direito eleitoral brasileiro muda mais que o tempo em São Paulo. Nada é estável. Cada eleição dá origem a uma lei exclusiva, em que, naturalmente, as maiorias cuidam mais de seus interesses imediatos do que dos interesses coletivos. Sucessivas leis novas, trazendo mudanças de forma e de substância, impossibilitam o estudo sério de seus efeitos, inviabilizam a pacificação das variáveis jurisprudenciais, e excluem qualquer caráter de permanência, na análise dos grandes problemas que as eleições geram, ano após ano.
Temos um Código Eleitoral e uma Lei Orgânica dos Partidos Políticos. São os documentos básicos, que, na aparência, dariam solidez à aplicação do direito ao processo eleitoral. Quem acreditar nisso será, porém, gravemente iludido, pois os dois diplomas legais básicos passam por transformações tão constantes que, neles, nada é definitivo.
A questão não se situa apenas na pluralidade de leis novas e na inexistência de critérios uniformes. Ela é seriamente agravada pela demora dos legisladores, que deixam tudo para o fim do prazo, produzindo leis defeituosas, em que o apunhalar do idioma nacional é preliminar para o sacrifício do direito. Pensava-se que a redação dada ao artigo 16 da Constituição ("A lei que alterar o processo eleitoral só entrará em vigor um ano após sua promulgação") impediria a volúpia legislativa, mas foi em vão. Foi mais prático emendar a Carta Magna, passando o artigo a determinar que a lei modificadora do processo eleitoral entra em vigor na data da publicação, mas se aplica à eleição ocorrida após um ano da data da vigência. A nova Lei dos Partidos Políticos é de 19 de setembro e a das eleições municipais de outubro é de 29 de setembro, ambas de 1995, ou seja, de poucos dias antes de terminar o prazo fatal para o pleito de 3 de outubro de 1996.
Além disso, elas, por si mesmas, não esgotam o mapa legislativo. Há que se ver a lei das inelegibilidades, com as mudanças ocorridas em 1994, sem falar em inúmeros outros textos legais e esparsos, resoluções do Tribunal Superior Eleitoral, propondo graves problemas para quem quer saber o que está e o que não está em vigor, num momento dado.
Tendo em conta a seriedade de tais problemas, o ministro Carlos Mário da Silva Velloso, enquanto presidente do Tribunal Superior Eleitoral, e a professora Carmen Lúcia Antunes Rocha, titular de Direito Constitucional na PUC de Minas Gerais, tiveram uma idéia feliz. Coordenaram o trabalho de publicação de estudos doutrinários sobre aspectos da prática do voto no Brasil. Prepararam temário diversificado. Convidaram autores de todo o país. Tive a alegria de participar do empreendimento e tratei das leis imperfeitas que incentivam a ilicitude eleitoral, tomando por um dos paradigmas a Lei nº 9.100/95, sobre o pleito do próximo 3 de outubro.
O livro, intitulado "Direito Eleitoral" (Del Rey, 392 páginas), teve seu lançamento no último sábado, em Brasília, e resume o moderno pensamento jurídico brasileiro. Marco Antonio de Oliveira Maciel, vice-presidente da República e um dos co-autores da obra, anota as dezenas de oportunidades perdidas para modernizarmos o sistema eleitoral em vigor. Reclama a consistência -hoje inexistente- entre o sistema eleitoral e o sistema partidário, sugerindo interessante classificação dos sistemas eleitorais, segundo sua eficácia, e a opção por um deles. O que não se pode, diz bem Maciel, é fazermos a opção pelo imobilismo. O imobilismo ante a necessidade de uma reforma séria tem levado, paradoxalmente, às criticadas leis em constante modificação, que, mantendo a instabilidade, quebram a seriedade do processo eleitoral.

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