São Paulo, sábado, 25 de maio de 1996
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Proálcool: como fica o abastecimento

LUCIANO ZICA

Com a expectativa de retirada do atual mecanismo de subsídio ao álcool combustível das contas da Petrobrás, o Ministério da Indústria, do Comércio e do Turismo (MICT) deflagrou, no início do governo FHC, um processo de ressurreição do Instituto do Açúcar e do Álcool (IAA), por meio da transferência da presidência da Cinal (Comissão Interministerial do Álcool) do MME para o MICT.
Essa absorção de poder visa à administração dos recursos do futuro "tributo verde", sugerido por ocasião dos debates sobre os rumos do Proálcool.
Para fortalecer essa gestão, o MICT tem buscado estabelecer uma reserva de mercado para expansão do Proálcool, na qual a política clientelista de subsídios e favores do governo viria a financiar o acréscimo da produção de álcool combustível.
Ao buscar esse objetivo, o MICT tem produzido uma abrangente coleção de fatores negativos para o país e para o consumidor, além de produzir reações da sociedade, que passa a ver o produto como um peso a ser suportado.
Em 1990, ocorreu a primeira grande falta desse produto, causando impacto na produção de veículos a álcool, que começou a declinar substancialmente. Entretanto, permaneceu ainda no país uma expressiva frota, o que exigiu do governo a busca de soluções.
Os estudos do governo apresentaram, basicamente, duas alternativas para atender à demanda: reduziu-se a adição de álcool à gasolina em algumas regiões do país e, em outras, o álcool foi substituído pelo MTBE.
No caso do álcool hidratado adotado como combustível puro, foi empregada a mistura ternária desenvolvida em parceria pelos órgãos de meio ambiente e pela Petrobrás, na qual, numa proporção de 60% de etanol mais 33% de metanol e 7% de gasolina, obtinha-se um excelente combustível para substituir o etanol puro, inclusive quanto aos aspectos ambientais.
Concluída essa etapa de soluções emergenciais, que se mostraram adequadas, iniciou-se no governo um processo de operações sem uma definição clara de qual a política a ser adotada para o álcool.
A diversidade de órgãos que interferiam (e ainda interferem) no processo permitiu que os agentes econômicos comandassem procedimentos visando atender seus interesses econômicos imediatos, sem compromisso com um programa sustentado.
Nessa fase começou a importação de álcool sintético, adquirido a preços inferiores aos do mercado interno, com maior rentabilidade, sem os riscos e investimentos inerentes à produção, mas recebendo igualmente o subsídio previsto para o produto nacional.
Começaram, então, pressões para manter aberto o maior mercado possível para essas importações, papel que vem sendo exercido atualmente pelo Departamento de Eventos e Promoções Comerciais do MICT, que vem negando sistematicamente qualquer apoio a alternativas econômica e tecnicamente mais vantajosas para a sociedade, impondo sempre soluções emergenciais e sem a seriedade com que o programa deveria ser tratado.
Essas soluções têm levado o DNC a praticar atos ilegais, com vistas a permitir o cumprimento de seu papel de abastecer o mercado de combustíveis.
A evidência da manipulação de informações do MICT está consubstanciada em suas propostas de planos de safra, nas quais, até o momento, não foram informadas as fontes de ofertas de álcool combustível, conforme determinação da portaria interdepartamental nº 38/95 -segundo a qual o DNC deve informar a demanda do ano-safra e o MICT, a oferta, até 30 de março de cada ano.
Previsões conservadoras de consumo indicam um volume de 4,7 milhões de metros cúbicos de álcool anidro e 9,8 milhões de metros cúbicos para o álcool hidratado no período compreendido para a safra 96/97, volumes esses que não serão produzidos no mercado interno com segurança.
Em 95, para um consumo de 3,5 milhões de metros cúbicos para o álcool anidro, foi importado 1,7 milhão. Em relação ao hidratado, foram produzidos 9,8 milhões de metros cúbicos e importados 2,3 milhões de metros cúbicos, segundo depoimento do presidente da Petrobrás, Joel Rennó, em audiência realizada na Câmara dos Deputados em 16 de abril deste ano.
Uma das saídas foi proposta pelo diretor de engenharia ambiental da Cetesb, em entrevista à Folha em que sugere a extensão do uso da mistura ternária. Essa idéia encontra resistência em alguns órgãos, que insistem em manter a sua visão míope do problema.
Sabemos que a safra prevista para 96/97 não atenderá à demanda, principalmente com a antecipação feita para atender ao déficit atual.
Ficam as perguntas: como será equacionado o problema de abastecimento para as safras futuras? Impedindo a administração planejada e reduzindo para zero a mistura de anidro à gasolina ao final da safra? Com a palavra, os órgãos responsáveis.

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