São Paulo, segunda-feira, 27 de maio de 1996
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Trabalhador informal está satisfeito, afirma IBGE

FERNANDO PAULINO NETO
DA SUCURSAL DO RIO

O presidente do IBGE, Simon Schwartzman, em seu escritório no Rio, diz que o instituto está trabalhando em pesquisa sobre padrão de vida

O IBGE (Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) divulgará sexta-feira uma pesquisa sobre trabalho informal que mostra o brasileiro satisfeito em trabalhar sem patrão e carteira assinada.
Entre os pesquisados, 85% dos que deixaram o trabalho assalariado para ter um negócio próprio não querem mudar de ramo ou buscar emprego no mercado formal. A pesquisa faz parte da nova política do sexagenário IBGE, a de priorizar as informações sociais.
O presidente do IBGE, Simon Schwartzman, não se surpreende com o resultado, mas reconhece a dificuldade do instituto para entender o mercado informal.
Para ele, uma parcela significativa do PIB (Produto Interno Bruto) não é medida (no caso do trabalho informal) ou é mal medida (no caso do setor de serviços).
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Folha - O IBGE vai divulgar pesquisa sobre trabalho informal em que mostra que só 15% das pessoas que têm um negócio informal querem mudar de ramo ou procurar emprego. O que isso significa?
Simon Schwartzman - O que a gente sabe é que o trabalho por conta própria rende mais do que o assalariado. O processo que está ocorrendo é que as indústrias estão demitindo o pessoal menos qualificado. Então, ele busca fazer uma coisa própria e não quer voltar. O que existe é o sujeito que, com a mulher, faz um negócio qualquer ou a mulher que vai de porta em porta vendendo produtos Avon. Não sabemos o tamanho disso, mas é um pedaço grande da economia que se sustenta dessa maneira: 30% das pessoas que trabalham informalmente o fazem em casa. Isso vai impactar de alguma maneira até nos cálculos do produto bruto (PIB), que é feito muito em cima dos dados formais.
Folha - Estes dados podem então fazer com que se calcule um PIB mais próximo da realidade?
Schwartzman - Mesmo na área formal de serviços, que cresceu muito, é difícil pegar informação, e nós não temos experiência nisso. A base de referência que o IBGE usa até hoje é de 85 e não pega, por exemplo, a indústria de software.
Estamos mudando este ano, mas estamos trabalhando até 96 com a base de 85. A base de serviços deve ter se modificado brutalmente de lá para cá. Isso acaba não entrando no cálculo. Você vê o movimento financeiro, mas não consegue pinçar o que está ocorrendo.
Tem ainda a área informal, que não aparece em registro nenhum. Meu filho de 15 anos, por exemplo, cobra R$ 15 a hora para instalar programas de acesso à Internet em computadores. Isso não é detectado por nenhuma pesquisa.
Folha - Como o IBGE está tratando os dados sociais?
Schwartzman - O governo tem nos solicitado informações sobre o que está acontecendo na área social e a gente está tentando atender o mais rapidamente possível. Estamos trabalhando no sentido de atender a demanda que estamos recebendo da sociedade para saber o que está ocorrendo na área social. Temos várias iniciativas neste sentido.
Folha - Já há algo que se possa adiantar?
Schwartzman - Os últimos dados disponíveis que temos são da PNAD (Pesquisa Nacional de Amostragem por Domicílio) de 93, que acabamos de divulgar. Pretendemos, até meados do ano, ter os dados da PNAD de 95. Será a primeira vez que teremos dados sistemáticos sobre a situação social depois do Plano Real. Estamos também com uma pesquisa de padrão de vida, muito detalhada, que entrou em campo há um mês e esperamos que até meados do ano a gente possa ter alguns resultados.
Folha - Que iniciativas estão sendo tomadas para atender as demandas por parte do governo?
Schwartzman - Em primeiro lugar, a atualização da PNAD. O IBGE demorou muito para divulgar a PNAD de 93, mas a de 95 deve ser em prazo muito mais curto. A gente está acelerando o processo para ter dados o mais rapidamente possível. Depois, nós estamos introduzindo alguns suplementos que tratam de captar alguns aspectos específicos de interesse social.
Esses suplementos são feitos com apoio do Grupo de Análise de Pesquisas (de assessoria da Presidência). Por solicitação deles e interesse nosso, estamos fazendo um suplemento da pesquisa mensal de emprego sobre associativismo e participação social. É um suplemento que está vendo se a pessoa é sindicalizada, como ela se organiza, filiação a partido político.
Vamos pegar também a questão da educação da família, origem social e situação profissional. É uma tentativa de entender o que está acontecendo com a participação das pessoas na sociedade.
Folha - Como o IBGE detecta se a pessoa está progredindo profissionalmente?
Schwartzman - Junto com a PNAD de 96, vamos ter um suplemento sobre mobilidade social. São perguntas sobre a família da pessoa e onde ela está hoje. E como ela evoluiu no trabalho. Nos anos 70, essa pesquisa mostrava que o Brasil tinha um índice de mobilidade mais alto. O país estava crescendo e as pessoas se moviam. Havia expansão das oportunidades.
Nos anos 80, o quadro já era mais difícil, a mobilidade caiu. Há cerca de dez anos não se faz essa pesquisa, não se sabe mais o que está acontecendo. Vamos realizar também dois censos, um agropecuário e outro populacional.
Folha - A ênfase nas pesquisas sociais está aumentando em detrimento das pesquisas econômicas?
Schwartzman -Antigamente, o centro da atenção eram a economia, as contas nacionais, a inflação e havia a idéia que isso podia gerar problemas sociais, então se examinavam os aspectos sociais associados a isso. Hoje, temos uma visão um pouco diferente. Você não deixa a questão social como um resíduo da atividade econômica.
Folha - O IBGE tem pessoal suficiente para fazer este trabalho?
Schwartzman -Temos grande carência de pessoal qualificado. Perdemos muita gente qualificada e não pudemos repor esse pessoal. Agora, o governo aprovou uma abertura de concurso, mas os salários são muito baixos.
Folha - O IBGE está deixando a sede da Mangueira, próxima à favela, por questões de segurança?
Schwartzman - Alguma coisa existe. A decisão foi motivada por uma série de coisas. Estamos dispersos em diversos lugares. O prédio da Mangueira tem problemas de instalação e teria de se fazer um grande investimento para usá-lo melhor. Temos um relacionamento estabelecido com a comunidade, mas é uma área complicada.
Folha - O sindicato dos funcionários do IBGE critica a mudança.
Schwartzman - Estamos licitando os móveis e o preço do aluguel é de R$ 15 o m2, que é o preço de mercado. Eles estão a fim de inventar alguma coisa. Fizeram uma conta errada do valor do aluguel.

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