São Paulo, sábado, 1 de junho de 1996
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Resultado ameaça paz com árabes

Futuro pode ser turbulento

CLÓVIS ROSSI
EM LONDRES

É fácil medir a diferença entre o governo trabalhista derrotado quarta-feira e a coalizão conservadora que venceu: basta saber o que cada qual pensa de Iasser Arafat, o líder palestino.
Para Yitzhak Rabin, o premiê assassinado, e seu sucessor, Shimon Peres, Arafat é (ou era) um "parceiro para a paz".
Para Ariel Sharon, o homem forte da coligação vencedora, Arafat não passa de "um criminoso de guerra".
É possível imaginar que o novo governo de Israel avançará no processo de paz, tendo como interlocutor um "criminoso de guerra"?
A lógica elementar manda dizer que não, por mais que se saiba que foram os "falcões" e não as "pombas" que conseguiram acordos de paz.
Turbulência
Imprevistos à parte, o mais provável é que se entre em um período de turbulência ainda maior do que o habitual no Oriente Médio.
A plataforma eleitoral do Likud veta, expressamente, a instalação de um Estado palestino.
Ora, foi a então remota possibilidade de criá-lo que esteve na origem da intifada, a revolta dos palestinos dos territórios ocupados, iniciada em 1987 e encerrada em 1993, após os acordos de paz de Oslo.
Até simpatizantes de "Bibi" concedem que afastar do horizonte o sonho palestino é chamar a intifada de volta.
Escreve, por exemplo, Abraham Rabinovich, no jornal "The Jerusalem Post" de ontem: "Se os palestinos acreditarem que têm poucas chances de alcançar suas aspirações políticas, a intifada poderia irromper de novo, desta vez de forma mais violenta".
Exagero? Não, se se agregar mais um dado à equação: os fundamentalistas do Hamas (Movimento de Resistência Islâmico) e do Hizbollah (Partido de Deus).
Impulso ao radicalismo
O bloqueio da aspiração palestina só dará razão aos extremistas que sempre se opuseram aos acordos de Oslo.
Se eles já atacaram com violência alvos judeus (e, em última análise, foram responsáveis pela derrota de Peres), por que deixariam de fazê-lo agora?
Ontem mesmo, Razi Mohamed, líder do Hamas na faixa de Gaza, já disse que "a eleição de Netanyahu é uma declaração de guerra ao povo palestino".
Se o Hamas responder ao que considera "declaração de guerra", como é o mais provável, fecha-se o círculo da violência.
"Bibi" prometeu, uma e mil vezes, durante a campanha eleitoral, que não haveria "santuários" para os terroristas e que, portanto, as forças israelenses iriam em busca deles onde quer que se escondessem.
Na prática, significa invadir aldeias e até cidades hoje sob autonomia palestina e policiadas por palestinos.
A polícia palestina tende, naturalmente, a reagir, criando a forma mais violenta de intifada prevista por Rabinovich.
Afinal, não serão só os jovens e adolescentes, armados na maior parte das vezes apenas de pedras, que enfrentarão as tropas israelenses.
Será também um corpo policial hoje com cerca de 35 mil homens, razoavelmente armados.
A intifada ficará parecendo brincadeira de crianças se se completar esse cenário, o mais provável, embora não inevitável, decorrente das eleições de quarta-feira.
Ainda mais que o resultado evidenciou, mais do que nunca, o profundo cisma da sociedade israelense, dividida exatamente ao meio entre partidários da paz e obcecados pela segurança e entre religiosos e leigos.

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