São Paulo, sábado, 1 de junho de 1996
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HOSPITAL OU CADEIA?

A morte por disenteria de pelo menos 13 idosos de uma clínica particular conveniada com o SUS é sintomática do grau de deterioração a que chegou a saúde pública no Brasil. Depois de Caruaru, agora é a clínica Santa Genoveva.
A situação mostra-se mais grave quando se considera que as vítimas fatais podem passar de 30 e que o agente etiológico desse surto de disenteria são bactérias do gênero Shigella. Ora, a shigellose é citada pela "Encyclopaedia Britannica" como doença típica de campos de prisioneiros em regiões tropicais.
Embora mesmo os países do Primeiro Mundo tenham, vez por outra, de enfrentar surtos dessa moléstia, seu principal vetor é a falta de higiene, pois a transmissão se dá, no mais das vezes, pela contaminação fecal-bucal, principalmente por meio de água infectada ou manuseio não-higiênico de alimentos.
As Shigellae são agentes extremamente infecciosos -dependendo das condições do paciente, bastam apenas dez bactérias para provocar a doença. Elas penetram o tecido epitelial da mucosa intestinal onde passam a reproduzir-se provocando a destruição desse tecido. Sangramento retal e desidratação drástica às vezes também ocorrem. O índice de mortalidade associado à moléstia pode chegar a taxas de 10% a 15%, dependendo da espécie e cepa das Shigellae. A necessidade de prevenção com cuidados mínimos de higiene fica, assim, patente.
Tanto nesse episódio como no da hemodiálise em Caruaru fica claro que o atual sistema de saúde, pelo qual o SUS paga valores ínfimos para que particulares prestem atendimento à população, está longe do ideal. Ele dá margem a que maus profissionais, que valorizam mais seus proventos do que a vida humana, descuidem das mais elementares noções de higiene, para reduzir custos.
O que diria Hipócrates, o pai da medicina, se visse que alguns de seus seguidores podem ser comparados a guardas de campos de prisioneiros?

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